domingo, 17 de janeiro de 2010

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É nestas alturas que não me arrependo de fumar.

O que eu dava para poder voltar a fumar um cigarro. Nunca dei um cêntimo pela minha vida, até ter lido a minha sentença. Dia 7 de Dezembro, às 22h. Aí sim, passamos a tratá-la, a nossa vida, como o nosso mais precioso tesouro. Não, como uma fortuna incalculável. Cada segundo, esse sim, é que é um tesouro bastante precioso.


Incrível como o ser humano consegue ser tão desprovido de compaixão; para além de assinarem a sentença de morte a um homem, ainda lhe perguntam quais são os seus últimos desejos como se fosse um acto de misericórdia. O que ninguém sabe é que os últimos desejos são a coisa mais hedionda que podem conceder a alguém que vai morrer. É mostrar-nos como nunca mais vamos saborear aquilo de que tanto gostamos na vida. Que tudo se vai acabar, por causa dos crimes que cometemos. Se eu fosse um tipo inteligente, tinha pedido pescada com bróculos. Mas não, tinha de ser heróico como sempre e humano como desde que nasci e, por isso, pedir um maço de cigarros e execução na guilhotina. Assim posso-lhes mostrar que não somos assim tão diferentes dos contemporâneos do séc. XVIII, onde morriam pessoas na praça pública, pessoas que eles rejeitavam mentalmente. Aquilo, de dizer que era tudo melhor antigamente, é uma treta. Treta. A diferença é pouca, quase nenhuma. Apenas umas quantas novas inovações tecnológicas que permitem que milhões vejam pela televisão, aquilo que umas poucas vêem in loco. Injecção letal, uma morte só com dor, sem espectáculo nenhum demais, enquanto que, numa guilhotina, tal como no nostálgico antigamente, verão o sangue ainda fresco salpicar-lhes as tão imaculadas roupas e corpinhos, e verão os imaculados olhos rolar a minha cabeça à frente da deles mesmos.

4 comentários:

Maldini disse...

Nice one O outro.

Isto tem continuação?

Sim senhor, ja ca faltava uma coisinha destas para descomprimir do estudo!

Maldini disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Mau disse...

Verdadeira literatura, Outro...

Agora como e quando serão os próximos posts da história? Esclarece a malta (e a mim também;) )

O Outro disse...

Ahah, não é não. E é natural que as pessoas não gostem. Não é necessariamente uma história, com um enredo. É uma biografia de uma parte da vida de alguém. Não são necessariamente capítulos, mas apenas seguidas cronologicamente, tipo diário, daí apenas as numerar.

Postarei as fracções em princípio numa base diária, por volta desta hora ou mais cedo, mas nunca antes das 22h. Não se acanhem por não me conhecerem, sou aberto a críticas, elas servem para evoluir. Por isso, sintam-se em casa (provavelmente é de onde estarão a ver, por isso, não digam que não o fazem :P).
O fim ainda não está previsto, até porque, eu próprio ainda não acabei a narrativa, mas também não há-de ser nenhuma obra literária digna do seu tamanho, provavelmente apenas um qualquer ensaio.

Um abraço, O Outro.

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