sábado, 18 de dezembro de 2010

Sabem quando...

Sabem quando os dias se tornam tão cheios que não sobra tempo para os descrever?
Sabem quando vivem tantas coisas que se torna imperioso não as esquecer?
Sabem quando dormem 3 horas porque sentem que cada segundo de sono é tempo a perder?
 
Sabem, durante 5 meses construí uma casa: no primeiro mês preocupei-me com a parte invisível. Construí a base mais segura possível. Foi penoso, porque os resultados não eram mensuráveis. Depois, começou a estar pronta para que eu pudesse juntar-lhe os tijolos. 
 
Aí minha casa foi crescendo, crescendo, crescendo... continua a crescer.  De vez em quando divirto-me a saltar do topo da casa e a dar uma volta voando por aí fora. Cumprimento o arco-íris que às vezes aparece, molho-me na chuva mas tenho sempre o Sol no horizonte. A minha casa estará inacabada até ao dia em que eu me vá deste mundo. E mesmo aí, quem sabe, alguém a continuará por mim.
 
Esse é o desejo, essa é a esperança. Não tenho nada a mostrar nem a acrescentar ao mundo dos outros. Mas ao longo destes meses tenho conseguido ver de um lugar cada vez mais alto, graças a cada tijolo da minha casa, o que me permite acrescentar tudo ao meu mundo. E, claro, de quanto mais alto espreito, mais longe a vista alcança.

Hoje encontro-me cheio de vôos por esses caminhos fora. Com uma quantidade de tijolos que era, para mim, impensável há bem pouco tempo. 
 
Seja cada tijolo uma experiência, cada voo um sonho, cada espreitadela do topo da casa uma esperança. Seja o arco-íris o resumo do que sinto na hora em que a despedida se aproxima. Seja cada gota de chuva o que já me fez chorar e que em breve me fará rir. E seja o Sol o que me fez rir e que provavelmente me fará chorar. Seja a minha casa um enorme plano de uma vida sem planos, de um aproveitar de tudo até que as forças se esgotem. De um "tornar infinito enquanto dure", de um "sentir tudo de todas as maneiras". Disse-me um dia um amigo chamado Álvaro de Campos, que "a melhor maneira de viajar é sentir". E, caramba, como eu sinto o suor de cada tijolo, de cada pingo de chuva, de cada raio de sol,  de cada cor do arco-íris, de cada voo a partir de minha casa.
 
Já falta pouco para que parte de mim regresse a Portugal. Mas, felizmente, do topo da minha casa eu poderei ver o Mundo todo...

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Há sempre um copo de mar para um homem navegar


No dia seguinte parti de manhã para o Centro. Andei a visitar aquilo e pedi a uns senhores para me tirarem uma foto – senão ninguém acreditava que eu lá tinha estado! Eles tiraram. Foi no Mercadão, o mercado municipal de São Paulo, que isso aconteceu. A dimensão é impressionante e a quantidade de pessoas que o frequentam assustadora. Um local fantástico que passa despercebido a tantos turistas...

No monumento seguinte voltei a encontrar os mesmos dois senhores. Aí eles vieram falar comigo… Eram de Curitiba mas estavam a viajar por São Paulo. Um deles tinha vivido em Coimbra. Convidaram-me para continuar a viagem com eles. Eu fui. Mostraram-me coisas que eu nunca veria se andasse sozinho. Foi em grande parte graças a eles que a viagem se tornou tão especial.

No Domingo fui ao Museu de Arte de São Paulo. Muito bom mesmo. El Greco, Van Gogh, Picasso, Monet, Manet entre tantos outros grandes nomes. E uma mostra de fotografia cinematográfica espectacular. Valeu bem os 3 euros do bilhete...

Segui para a Bienal de Arte que é algo de fabuloso. Tem como slogan a fantástica frase: "Há sempre um compo de mar para um homem navegar". E há mesmo. Diverti-me imenso. Passei lá a tarde toda...

A obra mais polémica da Bienal.

Quando saí vi que havia um concerto do Gilberto Gil.
- Quanto é o ingresso?
- Para estudantes 6 euros.
- Então quero um!
- Ah… estão esgotados.

QUE NOJO! ESTIVE PERTO DE LHE DAR UM MURRO, JURO!!!!

Insisti. Perguntei se não havia maneira nenhuma de arranjar bilhetes e ela disse que não. Fiquei conformado. Mas estava tão cansado que estive deitado na relva a descansar, perto da sala de espectáculos. Entretanto já era hora do concerto. Fui lá na mesma e… CONSEGUI OS BILHETES!

Tickets!

Vi o concerto do Gilberto Gil – que raramente dá concertos – e de outros artistas que tocavam com ele. A certa altura entram uma espécie de pauliteiros de Miranda brasileiros que deram um show dos diabos. Entraram pelo meio do público e subiram ao palco. Foram aplaudidos de pé. Mais até do que o próprio Gil...

Mas a parte gira vem agora: eles voltaram a sair pelo meio do público. E não é que o público começa a sair atrás deles? Resultado: o concerto continuou por mais meia hora fora da sala de espectáculos! Ficou tudo a dançar à volta deles… incrível! 6 euros, lembram-se?


Ainda fui à Avenida Paulista. Jantei por lá enquanto lia o guia que comprei de Buenos Aires. Há que preparar a viagem seguinte, né?

Entretanto, a tentar voltar para casa entrei num autocarro que dizia Continental. Devia ter apanhado o Parque Continental. Resultado: perdi-me em São Paulo. Tive de pedir ajuda a uns polícias para me ajudarem a dar com a rua... imaginem o susto! Não é propriamente o mesmo que perder-me a ir para casa do Ranhoca em Vila-Pouca-do-Campo. É algo um bocadito maior, mais perigoso e mais imponente...

Mas tudo correu bem. Dormi e no dia seguinte estava de volta ao Rio.
Rio esse que me pareceu uma cidade pequeníssima e sem movimento...

[Os senhores de Curitiba que conheci em São Paulo vão, dia 7, buscar-me ao aeroporto e mostrar-me a sua cidade. País de gente fantástica, este, hem?!]

domingo, 5 de dezembro de 2010

SP ou um paraíso diferente, escondido sob a capa dos prédios?

  
 Sala São Paulo - concerto de 44 reais visto de graça.

Ando sem tempo para isto. Conto actualizar tudo, contar todas as histórias quando voltar a Portugal. Até lá, uma vez que ninguém dá a mínima ajuda - e nisto dispenso todos os que estão em Erasmus, porque, de facto, é difícil arranjar tempo - o blog vai andando morto.

Acontece que há umas semanas fui para São Paulo, aquela cidade com tão má fama em Portugal. Conto aqui parte da história dessa minha aventura...

Na quinta-feira 11 de Novembro às 17 horas tinha desistido de tentar arranjar companhia para ir para lá. Estava quase decidido a não ir. Até que, qual louco, desci as escadas e comprei o bilhete de ida e volta. Fui sozinho para uma cidade com… VINTE E DOIS MILHÕES DE PESSOAS!!!!
Parti na Sexta-Feira de manhã. Cheguei às 14h. Ia para casa de um amigo do Caótico que, por sua vez, viria passar o fim-de-semana ao Rio. Ele mandou-me mensagem a dizer para “apanhar o metro até à consolação e depois um táxi para o Butantã”.

Metro de São Paulo.

Mal entro no metro fico louco. Aqui no Rio O RECORD (!!!) de pessoas no metro num dia é de 670 mil pessoas. Eu achava imenso. Até que vejo lá o seguinte: “Diariamente viajam no Metrô São Paulo, EM MÉDIA, 3 MILHÕES de pessoas”!!!!!!!!!

Acho que diz tudo, não?

Consegui chegar ao sítio certo. Quando chego à Avenida Paulista fiquei novamente espantado. Aqui no Rio os carros aceleram quando as pessoas atravessam a estrada nas passadeiras com o sinal vermelho. A Soraia descreveu isso muito bem quando cá veio: “Que raio de cidade. Os carros só porque são mais fortes que as pessoas usam esse poder. É mesmo a lei do mais forte.”

As pessoas são "mais fortes" que os próprios carros.

Em São Paulo acontece o mesmo. Só que ao contrário! Há TANTA, mas TANTA gente que as pessoas se tornam mais fortes do que qualquer carro. A massa humana é tanta que são as pessoas que passam continuamente mesmo com o sinal verde para os carros e esses, coitados, têm de parar…
Entretanto cheguei lá a casa do amigo do Caótico e ele ainda lá estava. Aconselhou-me um concerto na Sala São Paulo, que é lindíssima. Custava 44 reais (20 euros). Para ver música clássica. Decidi ir na mesma. O concerto começava às 20h e eu cheguei lá às 20h sem bilhete!


Pedi um ingresso e a senhora diz-me:
- Ah, tome este. É uma doação.
- Uma doação???
- Sim, houve um senhor que não podia vir ao concerto e deixou cá para quem quisesse…



Foi só uma tarde. Mas o melhor estava para vir...

domingo, 7 de novembro de 2010

"Estranhamentos" de um Português em Belém do Pará, Parte 2

 A melhor descrição que se pode fazer do Brasil em termos naturais é que tem tudo o que há em Portugal, mas com um tamanho e uma abundância 10 vezes superiores.
Frase do Yaúca, algures numa praia do Nordeste brasileiro

O Brasil, em geral, é assim. Mas Belém decide levar isto à letra.

Essa sensação começou logo que o nosso avião aterrou. Portugal tem um clima relativamente húmido, tem muito mar à sua volta. "Pois", pensou Belém, "se Portugal é húmido, então eu serei 10 vezes mais húmido!". E foi mesmo. Estava eu a contar: mal aterrámos a humidade era tanta que deixámos de conseguir ver a rua pela janela do avião. Ficou completamente embaciada - e não, não chovia lá fora! Quando saímos houve a velha sensação do Português que aterra no Nordeste (e, pelos vistos, também no Norte) do Brasil: "meu Deus, o ar não passa na garganta... vou morrer, não me vou habituar a isto!"

Mas essa era apenas a primeira de muitas manifestações da imponência natural desta cidade, deste estado, deste país.

As temperaturas, por exemplo, são sempre as mesmas. Disseram-me que assim era, o guia assim diz que é e hoje, quando procurei no Google as temperaturas em Belém... eram as mesmas de quando eu lá estive há um mês! O calor é insuportável: para que tenham uma noção os chuveiros não têm a torneira da água quente, só se toma banho de água fria!!!

Mas é de tal forma assim, que eu achava a minha casa quente, aqui no Rio. Na primeira noite em que dormi na Cidade Maravilhosa, depois de vir de Belém, tive de meter, pela primeira vez, cobertor! É que lá, mesmo com ar condicionado, eu dormia de tronco nu e sem cobertor, mas ainda acordava a transpirar!!!

O que me valeu foi que estamos na estação das chuvas. Não sei se será assim todo o ano, mas pelo menos agora é. Todo o santo dia chove. Chove de tal forma que as pessoas já programam a sua vida para antes e para depois da chuva. Acontece, geralmente, durante uma horinha, logo a seguir ao almoço.Mas atenção:  se quando faz calor, faz MUITO calor, quando chove, chove MUITO bem! É que lá, já se sabe, tem de ser tudo em grande...


Mas mudando de assunto: pensem num animal bem pequenino. Não, um rato é grande demais. Mais pequeno! Não, um lagarto ainda é grande. Uma formiga! Sim, uma formiga está bem. Este país de loucos não vai conseguir transformar as formigas num animal grande, que diabo...
Ou talvez vá. Garanto-vos eu que, durante um almoço na margem oposta à cidade de Belém, já na Amazónia, vi uma formiga que parecia uma aranha! Não tirei foto. Encontrava-me demasiado ocupado a saborear o meu "peixe à ver-o-peso" para tirar a máquina fotográfica da mochila.

Mas por falar em peixe, por falar em comida, por falar em Belém... as frutas! Uma quantidade de frutas completamente absurda vinda de uma floresta com uma extensão, também ela, absurda - ou não estivéssemos a falar da nossa boa e velha Amazónia! As frutas vão do açaí ao tucumã, passando pelo bacuri, o cupuaçu, a graviola, a taperebá, a pupunha, a castanha do pará, o muruci, a piquiá ou a bacaba, entre outros.

E os pratos, os pratos típicos, que são imensos! O pato no tucupi, o caranguejo, o caruru paraense, o casquinho de mussuã, o chibé, o cuscuz, a tacacá, o peixe moqueado, a pupunha, o piraricu de sol, a sopa de aviú... obviamente que não comi tudo isto - alguns destes nomes só decorei porque achei piada ao nome, e só pude escrevê-los aqui graças a uma visitinha à Wikipedia. Mas, de entre todos os pratos, o que mais me marcou foi a maniçoba!

 Maniçoba

A maniçoba é feita com folhas de maniva moídas e cozidas. Explicaram-me, enquanto me preparava para provar o prato, que aquilo tem de ser cozinhado durante uma semana, pois a planta tem um ácido venenoso que só com este preparo é retirado da mesma. Podem imaginar a minha sensação a comer um prato com um aspecto muito parecido com o de terra húmida, e que ainda por cima é feito com uma planta venenosa. Mesmo assim, valeu pela experiência. O sabor não é dos melhores, mas é diferente o suficiente para ficar na memória e por valer como interessante experiência gastronómica.

E continuando nesta parte gastronómica... CAIRU! A Cairu é uma gelataria (sorveteria, aqui no Brasil) fantástica. Tem mais de 60 sabores de coisas que vocês nunca sequer ouviram falar. Há gelados de açaí, araçá, bacaba, bacuri, buriti, carimbó (castanha do Pará com doce de cupuaçu), castanha-do-Pará, cupuaçu, graviola, jambo, mangaba, mangostão, mestiço (açaí com tapioca), murici, paraense (açaí e farinha de tapioca), pavê de cupuaçu, taperebá, tucumã, uxi... uf uf uf!!! Provei grande parte deles. Depois de os provar fiquei viciado. De tal forma viciado que o senhor já me conhecia como "o português da casquinha (cone, em português de Portugal) com uma bola de... CHOCOLATE!" ahah pois é, meus amigos. Por mais sabores que tenham, para mim basta haver um de qualidade: chocolate. O meu amigo Caótico atirava-me à cara que só eu é que ia para o Pará comer "sorvete" de chocolate... mas quem me conhece sabe-o: será assim no Pará, no Mato-Grosso, na Sibéria ou na Escandinávia. Gelado, lamento, mas é de chocolate!


Se pensam que acabei esta imensa crónica sobre a imensidão do Brasil, do Pará, de Belém estão muito enganados. Falta a parte que mais me impressionou: Mosqueiro.

Mosqueiro é uma um distrito do município de Belém e localiza-se na costa ocidental do Rio Pará, no braço sul do rio Amazonas. Fica a a cerca de 70 km de Belém... mas vale bem a distância! 

Apesar de ter visto várias praias, aquela em que acabei por ficar foi a do Paraíso. Acontece que nesse Paraíso, como em todas as outras praias de Mosqueiro, apesar de serem praias fluviais... há ondas tal e qual as do mar! E mais: o Rio é tão monstruoso, tão absurdamente grande, tão estupidamente imenso, tão incrivelmente enorme, que não se vê a outra margem. Na verdade só se vê água, água e mais água. Se no mar de vez em quando se vê a silhueta da costa, de uma ilha, bem lá ao fundo... ali estávamos num rio e não conseguíamos ver nada que não fosse água.
 
 Ambas as fotografias são da Praia Fluvial do Paraíso e
tiradas na mesma tarde. Reparem na velocidade com que o
tempo muda (estava um sol abrasador às 13h e uma chuva 
torrencial às 14h), nas ondas e no facto de não 
se ver a outra margem do rio.

Disseram-me que os portugueses quando chegaram ao Pará, nos primórdios da colonização, ficaram estupefactos com a extensão daquele rio. Incrível que, cerca de 500 anos depois, continue a deixar portugueses de queixo caído - e de tal forma desconfiados que precisaram de dar um mergulho e de sentir o sabor da água doce para acreditar que aquilo não era mar.

Fico-me por aqui, com esta crónica sobre um país, um estado, uma cidade onde tudo é exuberante: as formigas são enormes, os rios são gigantescos e as árvores são não só imensas como esmagadoras. Tem milhares de frutas, de sabores diferentes, de pratos típicos. Tem imenso sol, imenso calor, mas também imensa chuva. É um país, um estado, uma cidade de excessos, não tenham dúvidas. E esta é a única forma que tenho de vos mostrar um bocadinho deles...

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Ver-O-Peso - Belém do Pará, Parte 1


Esta selva anda demasiado quieta para o meu gosto. Nem de Nápoles, nem de Roterdão, nem de Barcelona, nem de Coimbra, nem de Trento, nem de Lisboa... nada! Regressemos, então, ao meu Brasil.

Desta vez não é, porém, até ao Rio de Janeiro que vamos viajar. Vamos até Belém, no estado do Pará, nas "Portas da Amazónia". Foi para lá que fui há já quase um mês...

Belém fica no Norte do Brasil. Do Rio de Janeiro até lá, com voo directo, são 3 horas e pouco de avião. É incrível como para viajar dentro de um mesmo país demoramos mais tempo do que a fazer uma ligação Lisboa-Paris ou Lisboa-Londres. Mas o Brasil é isto mesmo: um continente camuflado de país. Feita a introdução passemos, então, ao relato da viagem:

Fui para Belém com um amigo brasileiro. Já me tinha falado na cidade: que tinha amigos de lá e que já lá tinha ido duas vezes. Contou-me que a cidade ficava na Amazónia e bastante perto da linha do Equador. Que era incrível e que eu devia lá ir...

 Pirarucú - peixe do Amazonas que pode atingir 2 metros de comprimento


Passados uns dias, estava eu no facebook, aparece o meu amigo [chamado Caótico] e diz-me:
- Cara, está havendo um feirão da Gol (companhia aérea): há viagens baratas para Belém. Vamo? [sim, sem "s" no fim - estes cariocas adoram assassinar o português...].

E "fomo"!

Comecei por conhecer o Mercado Ver-O-Peso. É um dos mais tradicionais mercados brasileiros e é, também, o cartão postal de Belém. Foi construído em 1625 e situa-se na Baía do Guarajá. Fui com a Portuga e o Caótico até lá. Pensei que ele já conhecia bem o sítio. Antes de deixar o mercado acabou por me confessar:
"Já tinha vindo duas vezes a Belém e só tinha visto o mercado de longe... nunca aqui tinha entrado. Mal sabia o que aqui ia encontrar". [obviamente que o texto está traduzido para português de Portugal, visto eu ainda não ter aprendido a dar os erros nas conjugações verbais que me permitiriam reproduzir fielmente a oralidade do carioca].

 Senhora a descascar a bastante vendida castanha do Pará

E ele tinha razão. Por lá encontra-se um pouco de tudo: desde pirarucus até especiarias, passando por patos e galinhas vivos ou por artesanato índio. Mas passando também pelo açaí. E pelas toneladas de camarão que por lá se vendem. E pelas garrafinhas de "viagra natural". E pelos saquinhos de "amansa corno". E pelos bacuris. E pelas beribás. E pelas carambolas. E pelas graviolas. E pelas acerolas.  E pelos...


 Venda de camarão no Mercado Ver-O-Peso

Em suma: é um enorme mercado que se encontra às portas da amazónia e onde, por isso, podemos encontrar os nomes mais estranhos, os frutos mais incríveis e as pessoas mais genuínas que vi no Brasil. Não é fácil passear por um mercado sem ser constantemente abordado para comprar isto ou aquilo. Se não o é em Portugal muito menos o será no Brasil. E ainda menos se for um Português no Brasil...

Ali, porém, andava à vontade: de máquina em punho a aproveitar toda aquela confusão do aroma dos peixes misturado com a cor das frutas, com a beleza do artesanato, com o cheiro a fritos, ou tão simplesmente com os quadros das pimentas e malaguetas do Pará. Naquele mercado encontra-se tudo: encontra-se a vida do povo que vende, do povo que compra, do que apenas visita ou do que se perde por lá. Encontra-se a alegria ou a tristeza da vida que se leva, encontram-se histórias imensas e vidas incríveis por trás do olhar genuíno de cada Paraense.

Pimentas e malaguetas cujo nome verdadeiro desconheço - mas que ardem...!!!


Encontra-se um povo, uma terra, um estilo de vida. Um Brasil que não é o Rio. Um Brasil que é como é, que não se importa em esconder o que se esconde na grande metrópole. Encontra-se um outro modo de vida, um outro olhar sobre a vida.


Eu perdi-me por lá. Mas encontrei-me a mim.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

"O Sol ainda brilha na estrada que eu nunca passei", por Mim


Esta semana fez-me acreditar que há uma dimensão paralela algures por aqui. Fiz 3 exames seguidos, das 7:30 às 12:50, tentando não esquecer os conhecimentos sobre o hegemon financeiro e o emprestador de última instância, os diferentes níveis da hierarquia dos produtos e a Teoria das Ideias, mas tendo de os manter bem ordenadinhos para não falar de Sócrates no teste de Marketing ou da cadeia do produto em Negócios Internacionais. No final da semana fiquei sem saber, ao certo, se haverá esse mundo inteligível e esse mundo sensível. Mas fiquei com a certeza de que durante uma semana eu vivi em dois mundos diferentes...

Quando voltei ao meu mundo, na Sexta-Feira, tinha decidido ir passear para o Centro do Rio. Acordei e vim dar o meu passeio passeio pela internet: Público, ABola, Record, OJogo, IOL, Facebook, VaiPaSelva e Tapornumporco. Por acaso, nessa mesma manhã há um post que me é sugerido neste último blog. Chamava-se Estou-me a Vir, por Garoto de Ipanema e podem lê-lo se clicarem aqui (aconselho vivamente).

Acontece que estava um Sol que pedia praia... e logo ficou  decidido que o Centro seria visitado noutro dia. Dei dois mergulhos - a praia estava linda e a água óptima - e, logo, o tempo virou. O céu ficou encoberto, eu peguei nas minhas coisas, tomei um banho e vesti-me para ir ao Centro, como tinha inicialmente planeado.

Mas já há uns tempos que ando à procura de um posto de turismo no Rio, um sítio onde me dêem um mapa. Por isso vim à internet procurar um aqui, perto de minha casa ou no Centro. Não encontrei. Mas, por acaso, vi anunciado no site um concerto dos Green Day. Curioso, abri e quando cheguei à página dos concertos encontro em letras pequeninas: "Caetano Veloso, dia 8 de Outubro".
- Que dia é hoje? - perguntei.
- Sexta-Feira. Dia 8.
- Olha, já não vou sair convosco. Vou imediatamente comprar o bilhete para o Caetano e vou vê-lo logo à noite. Alguém quer vir?

Disseram que não. Meti a mochila às costas, fui buscar dinheiro e parti rumo ao Centro e à casa de espectáculos. Pelo caminho peguei no Destak e, na primeira página, o anúncio do concerto - na verdade era mais que um concerto: era a gravação do DVD do último CD lançado pelo Caetano (Zii e Zie) que será posto à venda brevemente.

Estive na fila sem grande esperança de arranjar bilhete. Quando soube que não estava lotado fiquei eufórico... então quando soube que o preço do bilhete eram 20 reais (cerca de 8 euros)!!!


Passeei pelo Centro durante o resto da tarde. Andei sem destino nem direcção: Cinelândia, Carioca (arranjei o meu relógio por 1,3 euros, comi um hambúrguer e bebi uma limonada por 50 cêntimos), Uruguaianas, Sebos na Rua Luís de Camões, Real Gabinete Português de Leitura, Catedral Presbiteriana, Rua da Carioca, Metrô, casa, Metrô, Vivo Rio, CAETANO VELOSO - ZII E ZIE!

Quanto ao concerto... só conhecia mesmo bem 3 músicas: Menina da Ria - que já teve direito a post aqui no VaiPaSelva (clique aqui para ver), Odeio e Billie Jean. Mas o concerto foi algo tão de outro mundo que tudo o que consegui foi conhecer mais umas tantas músicas geniais - fossem elas escritas pelo Caetano ou apenas interpretadas por ele. Transforma em ouro tudo em que toca. Um verdadeiro génio...

Aqui fica o alinhamento do concerto com os links para as músicas:

Faltam aí algumas músicas, provavelmente algumas até estarão fora de ordem. Mas não há-de estar muito longe disto, o alinhamento do concerto. Vim para casa (partilhei táxi com um mega-especialista em Caetano que é estudante de cinema no Rio e que conheci durante o show) e estive a re-ouvir o concerto no youtube.

Já deitado, às escuras, não consegui deixar de pensar: ainda bem que o dia acordou ensolarado, ainda bem que as nuvens cobriram o Sol, ainda bem que li o texto no Tapor - que me fez vibrar ainda mais com o Billie Jean -, ainda bem que decidi procurar um posto de turismo no Rio de Janeiro, ainda bem que arranjei o Destak, ainda bem que paguei os 20 reais, ainda bem que fui ao concerto, ainda bem que falei com o "especialista em Caetano", ainda bem que vim para casa e re-ouvi o concerto. Só de pensar que se o dia tivesse acordado nublado talvez eu tivesse perdido tudo isto...

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Barbeiro... ou tesoura nas mãos de um lenhador?


Chegara o dia: tinha de escolher um sítio para ir cortar o cabelo. 

"Onde diabo vou eu encontrar um cabeleireiro ou barbeiro nesta cidade?!", pensei. "Deixa-me ver nesta espécie de mini-shopping do outro lado da rua". E lá fui. Num edifício com muito poucas lojas mas, ainda assim, com 3 andares, havia 6 cabeleireiros. Com muito bom aspecto, mesmo. Contudo, não tinham preços à vista e não tinham nenhum homem lá dentro a não ser os próprios cabeleireiros. E ainda por cima não tinham os preços à vista. "Naaaa. Nesta não me apanham. Vou aqui à Galeria do lado. Só tem um piso mas pode ser que tenha sorte...".

Na galeria havia 4 cabeleireiros com bom aspecto, uma loja com tudo o necessário para cabeleireiros, outro cabeleireiro especializado em penteados africanos, um barbeiro e uma agência de viagens com uma placa a dizer "compro ouro" e onde estavam duas pessoas a... cortar o cabelo! Na galeria havia bons preços: 15 reais um dos cabeleireiros com bom aspecto, 18 outro, o barbeiro também 18...

A minha vontade era ir a um cabeleireiro mais confiável como os primeiros que tinha visto. Contudo, coisa estranha, em nenhum deles havia homens e todos eles estavam a abarrotar de mulheres que faziam pedicure, manicure e todas as outras coisas que podiam passar pela cabeça. "Fogo, não me vou meter ali. Pareço um doidinho..."

"Mas tu és um homem ou és um rato?!", pensei para mim mesmo. "No Brasil sê brasileiro: vamos lá ao barbeiro!". Quando lá chego vejo que está um cliente a ser atendido e dois sentados à espera. "Nunca mais daqui saio...vou mas é ver a galeria da frente.". Aí havia mais 3 cabeleireiros e uma loja de informática. Os cabeleireiros, também eles com bom aspecto, anunciavam mega-promoções: "Corte Masculino por apenas 25 reais!!!".

"Fogo! Mais vale ir ao barbeiro e ficar lá à espera...". Voltei atrás. Já só estava uma pessoa à espera, que entretanto tinha adormecido na cadeira. Abro a porta e logo essa pessoa se levanta num salto que faria inveja a qualquer atleta de salto em altura. "Mer...!", pensei.

O que estava a dormir era o barbeiro. Com os pelos a sair da camisa aberta, um ar de "barbeiro à antiga" assustador.
- Era para cortar o cabelo. Queria mais ou menos como está. Mas mais curto, claro...
- Com as orelhas à mostra?
- Hummmm... se calhar é melhor não!

E lá começa o senhor a cortar-me o cabelo. Levanta um tufo de cabelo e dá um corte em todo ele. Levanta outro tufo e mais um corte a direito. Depois, puxou o cabelo para a frente e fez o recorte de um círculo. E ali estava eu a olhar-me ao espelho com um sorriso cada vez maior, que tentava, a todo o custo, evitar as gargalhadas que na minha cabeça não tinham ainda parado.

Depois de cortado o cabelo como se estivesse a tentar adaptá-lo a um capacete, eis que ele pega novamente na outra tesoura: "Ah, afinal isto era só uma técnica nova, agora vai corrigir. Menos mal!", pensei.

Mas ele limitou-se a empurrar-me a cabeça para a frente e a cortar o cabelo da parte detrás da mesma em linha recta.

E assim foi. Passa para cá 18 reais que a minha parte já está feita.

Portanto agora sou eu que digo: se alguém precisar de costurar alguma coisa pode falar comigo. Eu mesmo costuro. Só peço 18 reais para ver se recupero o que gastei no barbeiro. E assim como assim percebo tanto de costura como ele de cortes de cabelo...

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Tiririca e... Portugal


Os brasileiros passam a vida a fazer piadas sobre os portugueses. Os portugueses são os burros: em Portugal fazem-se piadas sobre loiras (burras); aqui as piadas são exactamente as mesmas, mas trocam a palavra "loira" por "português". E, assim, todo o povo português fica com fama de burro...

Acontece que, agora, o mesmo povo brasileiro que chama burro ao povo português vota num palhaço (não no sentido pejorativo do termo) que é, ao que parece, analfabeto. Segundo consta, Tiririca não acabou o ensino primário. Como podemos ver no vídeo do final do post, precisou de ajuda do seu filho para ler as perguntas que lhe eram colocadas. E, mesmo assim, os brasileiros votaram nele.

Mas este post não é sobre Tiririca e o Brasil, mas sim sobre Tiririca e Portugal. Porque, de facto, eu acabo por concordar com esse estereótipo brasileiro em relação ao povo português. Obviamente que as generalizações são perigosas e, muitas vezes, insultuosas - será tema para post, mais tarde. Mas o que eu queria saber era o que vocês, selvagens, consideram uma atitude mais burra:

1) Votar no Tiririca sabendo à partida que ele não vai fazer nada e que é o simbolismo de todo o lixo político brasileiro. Elegê-lo como Deputado Federal sabendo que ele não apresenta nenhuma proposta séria para o período em que estará no cargo;

ou
2) Votar (segunda vez) num tal de José Sócrates para Primeiro Ministro sabendo que ele está associado ao caso freeport, à licenciatura marada, ao caso do apartamento de luxo comprado a preço módico, ao caso cova da beira, ao caso dos projectos Guarda/Covilhã, à «famiglia» mencionada como estando envolvida num caso de licenciamento público de um projecto privado - o freeport -, ao primo de shaolin, ao novo primo que também não está no país e é citado como intermediário no caso freeport, ao escandaloso silenciamento da redacção da TVI etc. etc. etc. e já tendo visto o que ele fez em 4 anos no cargo.

A minha opinião é simples: se no primeiro caso isto pode ser visto como um voto de protesto, no segundo não pode. Este protesto é, aliás, o argumento de muitos brasileiros. Não sei se sabem, mas aqui no Brasil é obrigatório votar:
"O eleitor que não votar nem justificar sua ausência nos prazos determinados pela Justiça Eleitoral incorrerá em multa imposta pelo Juiz Eleitoral. Sem a prova de que votou, pagou multa ou de que se justificou devidamente, não poderá o eleitor inscrever-se em concurso público, obter passaporte ou carteira de identidade, renovar matrícula em estabelecimentos de ensino oficial, obter empréstimos em estabelecimentos de crédito mantidos pelo governo, participar de concorrência e praticar qualquer ato para o qual se exija quitação do serviço militar ou imposto de renda. Se o eleitor deixar de votar em três eleições consecutivas, seu título será cancelado."

Assim, muitas vozes tenho ouvido (ou, melhor dizendo, muitas letras tenho lido) gritando que o voto obrigatório devia acabar. Que, não havendo alternativas sérias, o povo não devia ser obrigado a votar. E que, enquanto houver esta obrigatoriedade, o país ficará sujeito a estes votos de protesto, como acontece com o Tiririca.

Sejamos francos: alguém acredita que ele dará um bom deputado federal? Podemos, então, ver os paulistas que tão chingados são aqui no Rio de Janeiro, como os mártires do povo brasileiro: aqueles que preferem deixar o seu futuro nas mãos de um palhaço analfabeto, só para protestarem contra as alternativas existentes e contra a obrigatoriedade do voto.

Obviamente que isto é só uma interpretação das coisas. Muitas outras haverá - há, com certeza, quem ache que o povo paulista é tão burro que acha que o Tiririca é a melhor opção. A mim custa-me um pouco a acreditar...

Mas é aqui que entra a segunda alternativa: a alternativa José Sócrates. Mesmo sabendo tudo o que se sabe, mesmo tendo passado por tudo o que passou durante quatro dolorosos anos, o povo português vai às urnas eleger o mesmo inginheiro como Primeiro Ministro! Não há o voto obrigatório, não há essa justificativa de ser o mártir para provar que as alternativas são más (porque se assim fosse não o elegiam segunda vez)... será, talvez, por masoquismo. Ou por algo pior.

Em suma: Brasil e Tiririca, Portugal e José Sócrates - dois países tão diferentes e tão semelhantes. Resta saber quem merece mais as piadas da burrice. O voto no Tiririca é tão absurdo que a única lógica que vejo nele é aquela que expliquei em cima. Mas não se pode subestimar a burrice de um povo: a maior prova disso é que o Sócrates foi reeleito.

Fica, então, a dúvida. Tiririca como símbolo de um país. Resta saber se isso será bom ou mau...

Fica o vídeo do Tiririca:



PS: Parece que ainda por cima as mulheres fruta não foram eleitas. Agora é que me desiludiram, brasileiros: já que é para protestar mais valia ver as mulheres fruta na globo do que ver o Tiririca, né?!

domingo, 3 de outubro de 2010

U2 - 360 graus, Coimbra, por Numb in Tapornumporco


E pronto: os U2 lá tocaram ontem no meu quintal! Tocaram é como quem diz... O espectáculo que apresentam não pode ser visto como estritamente musical: é um espectáculo multimédia high tech em que a música é uma componente (fundamental, claro!), mas não a única. Montar um espectáculo destes envolve coisas tão diferentes como a engenharia e a arquitectura (a solução do palco a meio do relvado como uma enorme ilha cercada pelo mar revolto da multidão, a forma da garra, a alusão à nave espacial), luz, cor, som, performance, etc, etc. Vai longe o Verão de 1982 quando vi estes mesmos U2 em Vilar de Mouros, à data uma pequena banda irlandesa que despontava, dois discos gravados, apenas um (Boy) editado em Portugal. Lembro-me que eles cairam cá por acaso, para substituirem um grupo que falhou à última hora - já não me lembro do nome desse grupo mas nunca mais perdi os U2 de vista, já então me pareceram uma super banda com uma energia fantástica. Nessa altura apenas tinham essa energia e uma música do outro mundo. Fiquei impressionado com aquele guitarista, The Edge, que tanto tirava sons planantes da guitarra como riffs distorcidos e com a vitalidade do vocalista, Bono Vox que, nesse concerto, para desespero da segurança resolveu escalar as colunas do palco até ao cimo. Nesse concerto Bono fez um número que repetiu ontem: sacou uma fã para o palco e pôs-se a dançar com ela. Resulta sempre, a malta fica em delírio...

Os U2 que vi ontem já pouco têm a ver com os jovens irlandeses de 82. Mantêm a mesma vitalidade, mas o espectáculo é outro, uma espécie de celebração religiosa dos mega hits que o grupo foi editando eo longo de décadas de carreira. Em muitas músicas Bono nem precisa de cantar, o público está lá para isso, para as palminhas colectivas e para os coros dirigidos pelo maestro Bono. Aquilo é um ritual. Os U2 já não dependem tanto da música como em 82.
Mas tudo isto é natural. Os tempos são outros, a banda tornou-se a segunda maior do planeta (a seguir aos velhos Stones), eu sabia perfeitamente que o formato é agora este.

O concerto abriu com Beatiful Day, depois de uma introdução gravada a anunciar o clima sideral do concerto com Space Odity de David Bowie. Seguiram-se, por esta ordem, I will follow (um regresso ao concerto de 82 e um dos momentos da noite), get on your boots, magnificence e depois perdi-lhes a conta. Sei que tocaram elevation, i still haven`t found what i`m looking for, she moves (in misterious way), where the streets have no name (outra grande execução numa colagem a uma balada que tocaram antes), sunday bloody sunday, city of blinding lights (outro grande momento, o culminar dos efeitos especiais) vertigo (fantástico), miss sarajevo (fabuloso com Bono a fazer de Pavarotti nas partes em italiano), moment of surrender, i go grazy, one, walk on, e fecharam com with or without you. Pelo meio tocaram mais umas músicas cujo nome não sei.
De fora ficaram algumas das minhas preferidas mas ficariam sempre fosse o que fosse que eles tocassem. Mas tive pena de não ouvir pride, zoostation, zooropa, numb, gloria,lemon, gloria, bad, baby face... Mas reconheço-lhes o mérito de não fazerem do concerto uma parada de hits. Nem isso seria coerente com a postura da banda.

Do que não gostei mesmo foi do volume de som nas músicas mais rápidas e conhecidas. Acho que nessas músicas eles abusaram da potência e o resultado foi um efeito de barragem sonora em que não dá para reconhecer os diferentes instrumentos. É estranho que a guitarra do the edge surja compactada numa massa sonora indistinta. Os riffs de vertigo, de get on your boots ou de beatiful day mal se reconheciam no meio daquela amálgama sonora, quando deviam perceber-se claramente. Acho que nestas músicas o excesso de volume tirou energia quando era suposto produzi-la.

Quanto ao palco, a famosa garra de 360 graus é uma grande ideia. No início pareceu-me não resultar muito bem porque se perdiam os efeitos de fundo que existem nos palcos tradicionais. Mas depois percebeu-se que isso foi apenas uma opção na primeira parte do concerto. A partir da segunda série de músicas, a «nave espacial» foi ligada e somos esmagados com toda a panóplia de efeitos especiais aguardados. Há uma declaração de um astronauta numa estação espacial, sunday bloody sunday é tocado num fundo verde (Irlanda), mas curiosamente, as imagens são de intifadas em países muçulmanos, aparecem imagens de apoio a Aung Suu Kiy e até o bispo Desmond Tutu aparece numa mensagem a dizer-nos que as pessoas que venceram com Luther King, com Mandela e outros contra os regimes despóticos, são sempre as mesmas e estão ali... somos nós ( e eu pensei que esta mensagem é irónica quando dirigida a um povo que vota duas vezes num tiranete e que, portanto, é um exemplo não só de amorfismo, mas de amorfismo masoquista. Não, não somos nós um bom exemplo de um povo que derruba farsantes).

Hoje os U2 voltam ao meu quintal e está a chover. Seria lamentável se o concerto fosse cancelado por esse motivo. Espero que não. O pior do concerto de ontem foi quando recebi um sms do meu amigo roberto que teve convite para a zona vip. Dizia: «as gambas não estão más». E eu apertadinho na relva, em luta desesperada por um cantinho conquistado à custa de muita cotovelada não tive outra hipótese que não fosse remeter-lhe um «pó caralho». Até nos U2 há classe sociais, fónix...

sábado, 2 de outubro de 2010

Também há mitras no Rio de Janeiro

 
Também há mitras no Rio de Janeiro.

Vestem as mesmas calças com a meia branca para fora, o mesmo boné com a pala para o lado, as mesmas tatuagens e o mesmo brinco. Têm o mesmo andar gingão e o mesmo ar broeiro. Cheiram também a tabaco,  a maconha e a trinta mil raios. Não andam na Brotero... mas podiam andar.

Outro dia, passeava eu em Ipanema sozinho e eis que vejo dois mitras a virem no sentido contrário ao meu. Íamos ter de nos cruzar a bem ou a mal. Não havia volta a dar. A rua estava deserta. Vinham os dois com o seu cabelo rapado, as meias brancas para fora das calças e as suas cavas para deixarem as tatuagens bem visíveis. Ah! E, claro, o cap com a pala para o lado!

Estava com medo. Pensei numa solução mas acabei por me conformar: "serei assaltado como um homem e não como um rato". Mantive o passo acelerado mas convicto, tentando não mostrar o medo que sentia.

20 metros de distância - seguem os dois lado a lado. Olham para mim.

15 metros de distância - trocam um olhar entre eles.

10 metros de distância - há um que diz qualquer coisa ao ouvido do outro.

5 metros de distância - sorriem os dois e... dão as mãos.

Cruzámo-nos e eles continuaram a sua viagem por entre sorrisos e segredinhos, de mãos dadas e a trocarem carinhos.

Os mitras já não são o que eram, fogo!

O Rio de Janeiro, por Astérix


O Rio tem o estranho hábito moldar o nosso estado de espírito, isso é facto. Quando o céu está cinzento todo o Carioca perde a alegria e se fecha em casa. Com o sol sai à rua, vai à praia e faz a festa em cada esquina.

Hoje o dia acordou cinzento. Sentia-se o pouco movimento nas ruas, as pessoas a arrastarem-se e a aproveitarem para usar as botas e os casacos que só podem usar nestes dias mais tristes...

Talvez por isso, quando saí de casa logo reparei na enorme quantidade de mendigos que invadiam as ruas. Muitos deles pediam dinheiro, coisa relativamente incomum por estas bandas... não liguei muito. Era só o Rio a fazer-me olhar para ele com outros olhos...

Já pela tarde o telefone toca:
- Está sim? Olhe, está aqui o senhor para lhe cortar o gás.
- Como para cortar o gás se eu só cá estou há um mês nesta casa e a conta só chegou esta semana???
- Não sei... se calhar é melhor falar com ele.

Desci.
- Então, amigo [aqui toda a gente se trata por amigo], o que se passa? Eu pago já tudo o que devemos, apesar de as dívidas não serem nossas...
- Ah isso não pode ser, amigão [aqui também toda a gente se trata por amigão]. É que eu ganho por cada casa em que corto o gás, por isso vou mesmo cortá-lo. O que posso fazer é, se vocês me derem um cheirinho, fazer de conta que cortei e não corto.
- Como é?
- Ah... se me derem um cafezinho ficam com gás. Se não derem tudo bem: eu corto o gás e ficam pelo menos 5 dias sem ele mesmo que paguem ainda hoje. 10 reais [4,29€] estavam bem para mim...

País nojento, este. Se se querem vender pelo menos que o façam por uma quantia decente... em Portugal pelo menos os árbitros pedem mais que isso ao Jorge Nuno! 4,29€ não chega nem para cortar um fora de jogo...

Saía de casa novamente, ainda irritado com o Corrupto do Gás. Estava a entrar no metro quando uma senhora dos seus sessenta e tal anos:
- Ai meu querido [aqui toda a gente se trata por "meu querido"], não se importa de me pagar a viagem de metro? É que eu não tenho dinheiro e precisava de ir para casa...
- É que eu tenho o cartão do metro e só tenho um real trocado. Se quiser posso dar-lhe um real.
- Ah mas então passe o cartão para mim...
- É que eu estou com pressa, que vou para faculdade! Mas ande lá, vá... mas rápido!
- Eu queria ir ao banheiro, ainda. É que estou mesmo apertadinha. É que a viagem até minha casa é de uma hora e meia e só há banheiro aqui...
- Vá lá, ande...

DESESPERO! Há dias em que tudo corre mal, fogo...

Ao fim da tarde chego a casa e ligo o Facebook:
"NÃO VÃO AO BRADESCO DA VISCONDE DE PIRAJÁ!" [Isto é o Banco onde eu costumo ir...]
"Acabei de ser vítima de cartão clonado. Já sacaram 600 contos da conta."

E uma série de outras mensagens com gente conhecida a dizer que também já lhes tinha acontecido o mesmo. Em pânico corri para o computador. Estava tudo bem.
Que país é este onde nem a levantar dinheiro estamos seguros?! Não se pode confiar em ninguém, não se pode fazer nada sem cuidado. Tem tanto de maravilhoso como de horroroso.

Fui para a praia com o céu carregado. Sentei-me e começou a chover um pouco. Via os surfistas nas ondas com relâmpagos ao longe - "gente doida!", pensei. Ali fiquei uma hora, talvez duas. Perdi a noção do tempo. Entretanto houve um trovão que fez tremer a areia... levantei-me e caminhei até casa.

E foi a partir daqui que descobri mais uma faceta do Rio: mais do que moldar o nosso estado de espírito ele consegue moldar-se ao nosso estado de espírito. Num dia em que tudo parecia correr mal só faltava mesmo uma tempestade para que todo o quadro ficasse completo.

E foi o que aconteceu: logo comigo, que só tenho medo que o céu me caia em cima da cabeça, tive oportunidade de vê-lo a cair-me em cima sob a forma de uma tempestade impressionante...

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Não votaram nele? Bravo!



 A 25 de Novembro de 2009 Sócrates garantiu que não aumentaria impostos.
A 8 de Março de 2010 Sócrates vangloriou-se: “O mais fácil seria aumentar impostos”
A 12 de Maio de 2010 Sócrates estava satisfeito com crescimento no primeiro trimestre.
A 6 de Junho de 2010 Sócrates garantiu que o mais recente aumento de impostos era suficiente.
A 2 de Julho de 2010 Sócrates dizia que o crescimento do desemprego vai continuar a abrandar .
A 13 de Agosto de 2010 Sócrates garantia que o crescimento do PIB no segundo trimestre consiste num “sinal de grande encorajamento e confiança para a recuperação da economia portuguesa”.
A 24 de Agostro de 2010 Sócrates afirmava que o crescimento da economia portuguesa, entre Janeiro e Junho, foi o dobro do previsto pelo Governo.
A 29 de Setembro de 2010 Sócrates anuncia o segundo aumento de impostos do ano.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Meu sonho é morar numa favela

 
Eu estou em casa. 

Minha casa é a rua, é o Rio. A cama? A cama é isso aí... o chão. Toda a noite eu durmo ali, naquele degrau à saída do metro. Quando chove, como hoje, chego-me para aquele parapeito só para não apanhar tanta chuva. Não há lugares abrigados aqui no Flamengo. Quando chove o melhor é conhecer bem o lugar, para não apanhar um daqueles sítios em que a água se acumula.

Não tenho nada neste mundo. Só a roupa que tenho vestida, o meu corpo e a manta que fiz com os retalhos dos panos que encontrava no lixo. O lixo ainda é a minha sorte: todos os dias me levanto e vou remexer os caixotes em busca de latas velhas. 'Cê sabe que por cada kg de latas lhe dão 2 reais [86 cêntimos]? Bom negócio para quem vive na rua...

Família e amigos? Família nunca tive. Meus pais me abandonaram em pequeno nas ruas. Nunca os conheci. Amigos tinha lá na Rocinha [Favela]... uns foram mortos, outros estão presos, outros afastaram-se. Sabe que há coisas mais importantes que a amizade [mostra-me as mãos cheias de cicatrizes, como se tivessem sido trespassadas por um prego bem grosso].

Sabe o que é isso? É o maior erro da minha vida. Vivia eu na Rocinha e decidi roubar um turista que lá ia. Tinha fome. Ele tinha ido com máquina fotográfica para a Favela. Uma máquina daquelas dá-te comida para o mês inteiro, talvez para o ano. O papel do turista é não mostrar a riqueza. Se ele não cumpre o seu papel tenho eu de cumprir o meu: quem pode criticar?

Acontece que os traficantes não querem má publicidade para a Favela, senão não têm quem se aventure para lá ir comprar droga. São eles que controlam tudo, são eles que sabem tudo. A lei da favela é a lei do traficante, nunca a da polícia. Apanharam-me e disseram: 
"Mete as mãos uma em cima da outra. Sabes o que te acontece da próxima vez? Ficas sem elas, para aprenderes a não roubar. Desta vez seremos brandos... PUM!" 

Sim, mandaram um tiro nas minhas mãos. Furou as duas... Nesse dia eu decidi fugir da Rocinha. Era perigoso para mim e para os meus amigos. Eles também não mais me procuraram. Não guardo mágoa: eu faria o mesmo.

E, cara, agora eu dou valor ao que tinha. Ser um cidadão, mesmo que da favela, é muito melhor que ser lixo. Na verdade é o que eu sou. Só tenho o mar para me lavar. A minha rotina é simples: acordo, vou dar um mergulho - quando estou em condições -, procuro latas nos caixotes e, ao fim do dia, conto o dinheiro que juntei. Nos dias bons consigo 2 kgs de latas. São 6 reais. Não dá para uma refeição - a mais barata custa 8 reais e ainda por cima ninguém quer um monte de lixo sentado numa mesa ou ao balcão: dá mau aspecto -, mas já dá para comer qualquer coisinha. Um desses espetinhos na rua custam 3 reais. É o que costumo comer...

Depois disso, à noite, vou buscar o crack e a maconha para poder vender. Faço sempre um bom negócio: ganho 10 reais por dia se conseguir vender todo o stock. Em troca dão-me a dose suficiente para mim.

Faz mal? Eu sei. Mas como quer que eu viva com 6 reais? E 6 é nos dias bons! As latas velhas não sustentam ninguém. Os 10 reais da droga já me dão para qualquer coisa. Muitas das vezes gasto-os a comprar-me droga a mim mesmo: quando não acabo de vender o stock compensa-me mais comprar o que falta, para poder ganhar o dinheiro no dia seguinte. 

E quando a fome aperta, roubo. A fome e a "fome", claro. Só faz sentido um rapaz não ter vícios enquanto tem uma vida. Depois de ser lixo não há droga que o faça pior do que já é. Deixa-o fora de você, faz com que você esqueça as coisas e que adapte comportamentos que não teria de outra forma? E não é isso uma vantagem para um monte de lixo, pô? Quem se quer lembrar daquilo que é, de como age, daquilo que sente, se não é mais do que o "podre" que estraga as ruas do Rio e que tem de ser "varrido" para que se tirem as fotos para o cartão postal?

É uma vida de lixo. Não merece ser vivida. A droga fazer mal à saúde é a maior vantagem que vejo nela...

Bem, amigo, vou ter de ir procurar latas. Estas aqui não chegam sequer a meio quilo e já está quase na hora de almoço. Isto hoje está fraco. Provavelmente haverá um furto no Flamengo ao anoitecer...

domingo, 26 de setembro de 2010

Passeando pelo Centro do Rio (Parte I)


Primeiro que tudo deixe-me pedir desculpa ao JoãoMouRinho e ao Kapitão por ter "abafado" os posts, mas este post ou era agora ou já não era... 

[para ver os dois posts cliquem aqui e aqui]

Hoje tomei a (extremamente difícil) decisão de ir passear pelo Centro do Rio de Janeiro e não ver o Benfica. Falha grave. Contudo, como bom benfiquista que sou encarreguei-me de pedir a uns benfiquistas de confiança para me irem fazendo o relato enquanto o jogo decorria.

Passo, então, a contar-vos a minha tarde no Centro do Rio (horário do Rio de Janeiro):
15:43:14 - de Yaúca: "Grande lance de Gaitan e Saviola falha golo feito"
15:43:59 - de Poulsen: "Meia hora de pressão intensa mas não marcámos!"
15:45:24 - de Yaúca: "Outra vez Gaitán e Saviola falha"
15:50:30 - de Poulsen: "Mais um penalty por assinalar!"
15:51:15 - de Yaúca: "PENALTY DO TAMANHO DO CRISTO REDENTOR SOBRE O SAVIOLA. NÃO MARCA! INCRÍVEL!"
15:51:15 - de Yaúca: "Grande jogada do Cardozo e Gaitán falha. Antes disso grande defesa do Roberto"
16:01:43 - de Poulsen: "Não está facil. Já falhámos três golos claros..."
16:25:18 - de Yaúca: "Cardozo absolutamente isolado falha!"
16:27:10 - de Poulsen: "Mais dos golos certos falhados"
16:27:48 - de Yaúca: "Ainda mais incrível: Cardozo. Desta vez sem guarda-redes!"
16:31:06 - de M: "Golo do Benfica, Fábio Coentrão :)"
16:31:06 - de Yaúca: "GOLAÇO COENTRÃO!"
16:31:38 - de Poulsen: "Golo!!! Fábio!"
16:39:02 - de Yaúca: "Grande defesa do Roberto! A seguir o Saviola falha"
16:55:05 - de Argolinhas: "Estamos a ganhar 1-0, golo do Coentrão. O Cardozo falhou 2 sozinho, o Saviola mais 2 e o Gaitán outro. Ficou um penalty por marcar sobre o Saviola."
17:11:01 - de Argolinhas: "Ganhámos 1-0"
17:11:40 - de Poulsen: "Vitória :)"
17:12:04 - de Yaúca: "Vitória com mau árbitro. Fábio man of the match!"

E agora digam-me: alguém viu o jogo melhor do que eu?! Claro que não!!!
Obrigado Yaúca, Poulsen, Argolinhas e M, por me terem permitido ver o jogo enquanto passeava pelo Centro do Rio!

sábado, 25 de setembro de 2010

Cronici di Napoli - Primo Episodio



Decidi mudar de casa. Primeiro, a minha casa é muito pouco arejada e, segundo, tem um grande problema: não tenho rede. Como é que é possível??? Por isso, peguei nas minhas coisas e comecei à procura de uma stanza para mim, enquanto tento alugar o apartamento que já tinha pago anteriormente (uma grande confusão – é esta a minha vida nestes dias...).

Enquanto fazia uma pausa na minha vida de Jorge Mendes, decidi ir ao supermercati per trovare alcun cosa per mangiare. Quando me dirigia para casa vi três pessoas a olhar para um affitassi, escrevendo num caderno o respectivo número do telemóvel do inquilino. Nisto, perguntei:
- Sei italiano?
- No, no!
- Sei spagnolo?
- MouRinhooo!!
- Não posso! Como vos fui encontrar?!
- Já te ando a ligar desde ontem, mas tu tens sempre o telemóvel desligado!
- Não, por acaso está bem ligado, mas eu não tenho rede em casa e ontem só sai um pouco para ir à faculdade…

Tinha acabado de encontrar os meus amigos de Lisboa: due ragazzi e une ragazza. Eles não podem partilhar o meu “piso” porque só ficam em Nápoles durante seis meses – e eu fico um ano. Portanto, decidimos ir a minha casa deixar as coisas que tinha comprado e fomos procurar apartamentos. Vimos dois, mas para a história fica só um:

Eram 17 horas e já tínhamos ligado três vezes para a pessoa que tinha combinado mostrar-nos o apartamento. Estava presa no trânsito, disse-nos. Ficámos à espera dela em frente a um palazzo vicino a la piazza Luigi Mariglia. Era realmente um prédio muito bem arranjado, com porteiro e, acima de tudo, era limpo – se vivessem em Nápoles iam aprender a dar valor a isso.

Passado uns breves instantes, lá chegaram a dona do apartamento e outras duas pessoas. Tinha mesmo valido a pena tal espera. Fomos cumprimentados pela dona do apartamento, com os seus 65 anos, pela filha, Maria Laura, talvez uns 26, e uma amiga, que pouco importa para história – apesar de ser um pedaço a considerar.
“Sorry, but wasn’t my fault”, desculpava-se Maria Laura.

Eu nem respondi. Apenas pensava: de onde é que isto saiu?!?!?!
Não podia fazer qualquer tipo de comentário, pois mal conhecia os rapazes e a rapariga.
- Andiamo, andiamo! – guinchava a velha que irritava até aos cães que vagueavam pelas ruelas!

Entrámos no prédio, subimos até ao 1º piano e entrámos no verdadeiro palácio. Eu estava maravilhado com o que estava a ver: Uma casa enorme, super moderna, com dois quarto duplos, uma casa de banho com hidromassagem, duas varandas enormes (uma dum quarto virado para a rua e a outra que ligava a cozinha com o primeiro quarto, virada para o terraço interior do prédio), duas televisões enormes, fogão, placa vitro cerâmica… BELLISSIMA!

Foi então que comecei a falar com a Maria Laura:
- How much is this flat?
- 1000 euros, 250 per person
- With condominio?
- Yes, more gas and electricity. It will be 80 euros by 2 months…

Expliquei a minha situação, dizendo que estava noutro apartamento mas que queria mudar para mais perto e para um local com melhores condições. Ela foi muito simpática comigo e perguntou-me onde eu estava. De seguida, sem eu estar à espera, diz:
- Can I see your apartment? I want to live here, near this place.
- But my flat is for two people!
- Yeah, don’t worry. I’ll see with my friend.

Nisto ela tropeça e quase que cai para cima de mim (isto eu não vi, foi-me dito por um dos rapazes). “Mas porque raio esta rapariga quer ver o meu apartamento, visto que tem aqui uma casa espectacular?”, pensava eu.

Continuámos a ver os pormenores da casa e ela vem atrás de mim:
- Where you came from? What are you studying?
Eu, sinceramente, estava mais preocupado com a casa do que com ela, mas aquilo estava-me a perturbar!
Quando saímos da casa, ela pergunta-me:
- How old are you?
- 20.
- Do you want take a coffe now?
- Erm… yes… – “mas não era para ver a minha casa? Onde eu me fui meter…”
- Olhem, alguém que venha comigo ver a casa com ela. Estou com medo que me roube ou me tire algum rim. É que já me aconteceu uma historia um pouco estranha aqui em Nápoles… Olha, vem tu, que andas no kickboxing – dizia eu para um deles.

Ele não se importou, até porque ela era maravilhosa: talvez das raparigas mais bonitas e mais compostas que alguma vez havia observado na minha vida!

Fomos tomar o café, ela pagou-me e fomos para a minha casa. Nada de outro mundo se passou. Apercebeu-se de que eu estava um pouco receoso, viu a casa e disse que não era bem aquilo que estava à espera de encontrar. Na verdade, a casa não se comparava à da mãe dela.

Saímos e fomos ter com os outros dois. Não sei o que se passou, estava super nervoso: primeiro, porque não sabia o que uma rapariga daquelas pretendia da minha casa, depois porque Nápoles não é propriamente uma cidade segura e, por fim, não sabia o que ela via em mim para confiar tanto e ir ver uma casa que nem sequer era minha, sendo ela napolitana, ainda por cima!

A história que vos conto não tem um final feliz, mas pode vir a ter. Porquê? Porque antes de sairmos do palácio real, ela deu-me o número dela. Independentemente de ficar ou não com a casa, vou-lhe mandar um messagio!!!

PS: No fim de tudo, e quando já estávamos de volta aos nossos negócios, o rapaz do kickboxing disse me assim:
-Mas tu ouviste bem o que ela disse lá em casa?
-O quê?
-Ah quando aqui fizerem festas convidem-me…
-Estava tão nervoso que parte das coisas que ela dizia não conseguia ouvir!
-E viste o que a outra amiga fez à Maria Laura quando saímos do café?
-Não… O quê?
-…

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