quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

2 - Felicidade / Hapiness, por Mário Carvalho



Se sou feliz? Sou. Acho que posso dizer que sou feliz. Se me perguntasses isso há uma semana responder-te-ia sem reservas. Mas de lá para cá li um livro que me deixou a pensar em que raio de sentido tem a minha vida.

O autor era o Camus. Conheces o Camus? Pois… ele tem um livro que se chama O Mito de Sísifo. Não leste? Pois então não leias. Faz-te pensar.

Mas estava eu a explicar-te de onde vêm as minhas reservas… Sísifo, segundo a mitologia grega, foi condenado pelos deuses a, para toda a eternidade, empurrar uma pedra de mármore até ao topo de uma montanha. Sempre que estava perto de chegar ao topo, a pedra rolava mais uma vez pela montanha abaixo até ao ponto de partida. E isto repetia-se uma e outra e outra e outra vez. Para todo o sempre.

Toma agora consciência do estúpido destino de Sísifo: ele sabia que tinha de empurrar a pedra com grande esforço e sabia que a pedra ia voltar a rolar montanha abaixo para todo o sempre. Que sentido teria uma vida assim?

Diz Camus que o que interessa em Sísifo é o momento em que ele regressa montanha abaixo, porque essa é “a hora da consciência”. E, reforça, “se este mito é trágico, é porque o seu herói é consciente.”

Foi aqui que parei, que pensei e que, de repente, se fez luz na minha cabeça. De facto, se Sísifo tivesse uma réstia de esperança de que a pedra chegasse ao cume, este mito nada teria de dramático. Porque ele teria uma razão para levar a pedra, teria algo que motivasse o seu esforço. Mas assim, consciente de que tudo o que faça será em vão, este é um destino cruel, destruidor.

A partir desse momento passei a odiar Camus. A odiá-lo com todas as minhas forças. Porquê? Porque foi ELE que me fez ter consciência da minha vida absurda. Afinal de contas não serei eu próprio Sísifo? Não o seremos todos?

Que faço eu? Acordo, e passo o dia no hospital a aturar os meus malucos. Todos os dias. Ver o Sr. Ricardo a nadar em cima de um azulejo e a dar cambalhotas numa cama, o Sr. João a espalhar a mensagem do “S”enhor, a D. Maria a olhar para aquela maldita parede branca… depois volto a casa e descanso para o dia de trabalho que virá. Passo cinco dias a esperar pelo fim-de-semana e dois a descansar para a semana de trabalho.

Macacos me mordam se esta rotina não é a de Sísifo. É, claro que é! Todo o santo dia eu empurro aquela pedra rumo ao topo da montanha para, no final, saber que terei de recomeçar tudo de novo. Será assim, será sempre assim. Até que as forças deixem de mo permitir. Nessa altura haverá o descanso da morte que ninguém sabe o que traz com ela.

Uma vida absurda.
Sim,
é isso que eu tenho.
É isso que todos temos.
Aahhh, como eu odeio Camus…

Mário Carvalho

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

1 - Norma / Norm

Criança. Doente. Louco. Maluco.

Internaram-me nisto a que chamam “hospício”. Tudo porque me recuso a ver a vida como eles. Dizem que “não me comporto segundo as regras”, que “não respeito os princípios da sociedade”. Para mim é um elogio. Afinal de contas nenhum de nós sabe onde é que começa e onde é que acaba a realidade.

Fizeram um daqueles “planos de reinserção” para me ensinar que uma cama é uma cama, que um chão é um chão. Mas eu rio-me! Rio-me porque não vou perder o meu olhar de sempre. Dizem eles que eram assim enquanto crianças, mas que depois “cresceram”, que “aprenderam”.

Onde eles vêem uma cama, eu vejo um barco. Onde eles vêem um chão, eu vejo mar. E passo tardes inteiras a lutar contra os piratas que me vêm atacar.

Para eles não passo de um louco que dá saltos e cambalhotas em cima de uma cama; de um maluco que nada deitado num chão de azulejo. Pobres coitados: ainda não perceberam que os sentidos enganam e que se há sentido para a vida, ele não reside em moldá-los àquilo que é “socialmente aceitável”.

Olhar para eles entristece-me. Passam uma infância podendo viajar para qualquer lado apenas usando a imaginação. Depois, moldam-se, padronizam-se: trabalham arduamente para se formarem, para ganharem dinheiro e para poderem gastá-lo a ver outros sítios, a ver outras coisas.

Não entendem que não estão a aprender, que não estão a ver nada de novo – que, pelo contrário, estão a perder o poder de o fazer. Não percebem que tudo o que vêem está dentro deles.

E que eu, com o meu barco, irei sempre mais longe do que qualquer sítio onde eles poderão um dia ir.

Que verei muito mais além do que eles poderão um dia [voltar] a ver.

Ricardo Pires

It is all about madness, crazyness.

They putted me in this “madhouse”. Just because I do not see life as they do. They say that I "do not behave according to the rules", that I "do not respect the standards of society." To me that is just praise. After all, none of us know where does the reality start and where does it end.

They did one of those "reintegration plans" for teaching me that a bed is a bed, and that a floor is a floor. And I laughed! I laughed because I would not change the way I see the world. They say when they were children they were used to do the same I do, but that then they "grew", they "learned".

Where they see a bed, I see a boat. Where they see a floor, I see the sea. And I spend entire afternoons to fight pirates who are attacking me and my boat.

For them I am just a mad guy who leaps and somersaults atop a bed; I am a crazy man trying to swim lying on a tile floor. Poor people: they have not yet realized that the senses deceive and that if life has meaning, it is not in mold the senses to what is "socially acceptable."

Take a look at them saddens me. They spend a childhood being able to travel anywhere just using their imagination. And then they shape up, standardize up: they work hard to graduate, to earn money in order to spend it buying travels to other places, to see other things.

They do not understand that they are not learning, that they are not seeing anything new; that, on the contrary, they are losing the power to do so. They do not realize that everything they see is inside them.

And that, with my boat, I will always far more than any place they might one day go.

That I will see much more beyond than they will ever be able to see [again].

sábado, 9 de fevereiro de 2013

Foi assim que (re)começou



 “Um poema por dia até dia 7 Janeiro de 2014, esta é a minha resolução.”

Começou há um mês e dois dias, no Facebook. Louco. Ele é louco. Diz que vai fazer 365 poemas em 365 dias para activar a mente. Sugerem-lhe que faça puzzles e ele diz que é precisamente o que está a fazer: puzzles de palavras. Podia guardá-los para ele, então, como tantos outros – assim, pelo menos, não expunha a sua loucura, não correria o risco de ser ridicularizado.

Hoje vai no trigésimo segundo poema.

E é ao trigésimo segundo poema que perco meia hora do meu dia para ler o que o Pedro anda a fazer. Comecei por ler com rapidez, com poemas banais… acabei a lê-los em voz alta, porque de repente ele começou a fazer música com as palavras escritas.

Lembrou-me que “de poeta e de louco todos temos um pouco”. A partir de hoje serei o segundo louco deste movimento. O Pedro foi um pouco louco e passou 32 dias sem se importar sequer um pouco se alguém o lia ou não. Escrevia para ele. Afinal de contas limitava-se a fazer um puzzle por dia. Para minha delícia. Para minha inspiração. Para eu voltar à escrita, essa minha velha paixão.

Porque, como (sem saber que o fazia) gentilmente me explicou, o importante é que “não nos guiemos pelo sistema perfeito de roldanas que falha sem se notar”, mas sim “pelos instintos, pelos sentidos, pelas emoções”. O que importa é que nos guiemos “pelos [nossos] corações”.

domingo, 13 de janeiro de 2013

Que saudades tuas...

I am the escaped one,
After I was born
They locked me up inside me
But I left.
My soul seeks me,
Through hills and valley,
I hope my soul
Never finds me.
           Fernando Pessoa

Estou há horas a falar contigo e só agora me apercebo de como não falamos verdadeiramente desde o Brasil.
Dizem que viajar sozinho é uma experiência solitária, mas não consigo deixar de pensar que é a solidão mais colectiva que conheço.
Tenho saudades tuas, sabes? Tuas ou minhas, sei lá... que interessa o jogo de palavras, se eu gosto mesmo de tratar por "tu" o meu "eu", ou por "eu" o "tu" que há em mim? Por incrível que pareça, só me lembro de ti - ou de mim - quando viajamos só nós. É algo que quem não viaja sozinho não pode entender. Mas que é precisamente a grande vantagem de o fazer: que bom que é ficar assim, agora, a conversar contigo em silêncio olhando o frio lá fora...

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Harakiri da Samsung Portugal


Inacreditável. É a única coisa que se pode dizer sobre esta campanha da Samsung chamada "Desejos para 2013".

Depois de ver os vídeos - acreditem que custou bastante aguentar até ao fim - só consigo exprimir a minha estupefacção. Saibamos ou não algo de marketing, esta campanha só pode ser definida como um desastre: estamos em Portugal, um país devastado pela crise, sem perspectivas de melhoria... e a Samsung entrevista gente que diz que para 2013 quer "menos: ter menos coisas, menos assesórios, MENOS! Muito menos! Comprar menos, ter menos à" sua volta.

A questão que se levanta é óbvia: é este o público-alvo da Samsung? E, se for, como é definido o público-alvo? O público da ostentação, da futilidade...?

A campanha é um falhanço tremendo, de uma insensibilidade inacreditável, com um objectivo qualquer que é, para mim, impossível de entender. Aliás: a própria Samsung já reconheceu o erro: as reacções foram tão negativas que os vídeos já não se encontram na sua página do Youtube.

É o problema da internet: uma vez cá, para sempre cá. 

Eu, pelo sim pelo não, já fiz o download dos vídeos, não vão eles desaparecer. 

É que também é importante aprender como não fazer...






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