Estava eu a passear na nossa cidade quando me deparei com algo que me elucidou para um facto que afecta muitos portugueses, segundo se diz. E digo “segundo se diz” porque, felizmente, ainda não vivo esse drama nem convivo proximamente com as vítimas do mesmo, daí o meu espanto.
No meio de tantos transeuntes, avistei uma mulher. Simples, vestida com roupas humildes, com cabelo limpo (pelo que aparentava), mãos suaves, unhas desprovidas de qualquer conspurcação. Uma simples mulher que poderia ali estar como tantas outras, pelo mesmo motivo de toda aquela multidão. No entanto, algo nela me cativou o olhar: estava sentada à porta de uma loja, com um copo de plástico na mão. A vergonha ainda não lhe permitia apregoar a miséria em que se encontrava, nem denunciar o que lhe iria na alma. Estava ali, sentada, muda, num olhar disperso, de inveja por aqueles que ainda não a tinham percebido e que não eram seus cúmplices na pobreza.
Mais uns metros andei, termino a rua, passo uma praça, outra rua e mais outra. Nesta, porém, essa miséria já há muito tem sido partilhada e denunciada, mas naquele dia havia uma novidade: o peditório revertia a favor da arte! É verdade meus caros, a arte também se tornou agora pedinte, não por ser pobre (esperemos), mas porque a sua riqueza deixara de ser apreciada e valorizada.
Estava um senhor a esculpir parte de um tronco de uma árvore e junto a ele estava um cartaz onde constava que iria representar a “nossa região” num concurso internacional, mas como não tinha apoio estatal, solicitava ajuda para minimizar os custos de transporte e alojamento.
Comecei a reflectir na problemática associada: qual é a função do Estado? Garantir a segurança, a justiça e o bem-estar no território da sua jurisdição. Mas como é que o Estado consegue arranjar dinheiro para novos equipamentos hospitalares, pagar a médicos, professores, juízes e polícias, pagar “tretas” como o Magalhães a todos os alunos da primária e aos elementos do governo, dar subsídios de desemprego, rendimentos mínimos a quem não faz nada na vida, apoios às PME’s, pagar TGV’s e aeroportos e alimentar criminosos que têm vida boa na prisão (e agora mais uns de Guantánamo para aumentar a despesa) enquanto que os que cá estão fora se lixam?
E para ajudar à festa, agora se a gripe A decidir contaminar tudo e todos lá vai a Segurança Social pagar 65% das remunerações dos trabalhadores. E as despesas dos senhores do Parlamento? Só na renovação da frota dos doutores de alto gabarito do Estado gastou-se cerca de 1 milhão de euros (as outras viaturas tinham entre 10 e 12 anos e já davam muitas dores de cabeça em reparações). A Assembleia da República também precisava de se modernizar: como os Magalhães eram só para o ministros e assessores, os outros deputados estavam em desvantagem, era injusto. Mais 5 milhões do nosso bolso para lavar a cara ao Parlamento e dar-lhe um aspecto inovador e tecnológico.
Com tanta despesa, como é que o Estado consegues despender uns trocos para aqueles que não só fazem arte mas fazem da arte um modo de vida? Não é fácil! Onde residirá o problema? Na má distribuição das verbas aquando da aprovação do Orçamento de Estado? Talvez. Mas acima de tudo trata-se de um questão de cultura, de hierarquia de valores e de prioridades, de valorização do que é nosso, muitas das vezes apenas de bom-senso.
17 comentários:
Antes de mais, grande post kikas ;) Demonstra bem os problemas da nossa sociedade. Quero acreditar que esses problemas nao existem so no nosso país mas por todo mundo fora. "Só na renovação da frota dos doutores de alto gabarito do Estado gastou-se cerca de 1 milhão de euros", sobre esta frase que escreveste, é vergonhoso haver doutores de alto gabarito que andem com carros de 100 mil euros, como eu sei q andam, financiados por todos nós só pq supostamente têm um cargo importante e têm q estar bem representados. Se ter "doutores de alto gabarito" com carros de 100 mil euros e ao mesmo tempo ter pessoas na rua a pedir, a passar fome, desempregadas, sem uma casa para viver, sem condiçoes minimas de vida, se isso tudo é andar bem representado ou se isso tudo é ter um país bem representado entao isso é (so me ocorre uma palavra) estupido?!! Será q o estado em vez de "dar" a esses doutores carros de 100 mil euros nao podia "dar" carros de metade do preço e usar a outra metade para subsidios, investimentos, etc ?? Enquanto houver tal disparidade entre ricos e pobres nunca chegaremos à igualdade. E acho q isto aplica-se nao so para portugal mas para todo o mundo.
gostei muito do post. Obrigado Kikas por teres sido (e continuares) um dos elementos mais activos deste blog
Só para teres uma noção, o Jaime Gama em vez de um carro, teve direito a 2! Um série 7 de 150 mil euros e um série 5 de 70 mil euros (à custa dos extras). Ah e até o Mota Amaral que é ex-Presidente da Assembleia da República neste momento (repito: ex-Presidente!) teve direito a carrinho novo, por causa de um acordo inter-partidário.
Mas sabes que no nosso país vive-se de status, e então a única dúvida quanto a carros é entre a BMW e a Mercedes, quando há outros carros como o VW Passat, o Citroen C5 ou mesmo o novo Opel Insignia que são também bons carros e com algum "porte", só que mais baratos.
Ranhoca, sempre que puder, vão ter que me continuar a aturar;)
Grande post mesmo, Parabéns =) E infelizmente está mesmo tudo dito ... =X
Mas sinceramente pra mim o mais grave é ver a indiferença, a habituação na cara das pessoas perante esta situação. Mais grave é passar, por exemplo, no terreiro do paço, ver dezenas de pessoas a dormir literalmente no meio do caminho e simplesmente ignorar. Grave é constatar que tanta gente se mostra indignada com a situação de cada vez mais pessoas no nosso país para que depois, quando chega o momento de fazer alguma coisa de útil soltarem um "que nojo, não olhes" como ouvi ao passar por ali =X
Grave é ir às urgências do Sta Maria e ver um indivíduo com uns 60 e tal anos, claramente debilitado, a preparar-se pra pernoitar no chão perante a indiferença de todos. Pior! grave é comprar uma sandes e dar-lhe para depois ouvir "a menina não devia ter feito isso! depois ele já não vai querer sair daqui!" (sim eu estou a falar de um ser humano,não de um cão vadio).
enfim .. não basta mudar os hábitos dos "srs doutores" (digo eu).
É uma grande verdade B, muita coisa passa também pela mentalidade do chamado Zé Povinho. Tal como os grandes valores, tudo começa debaixo, e se há valores que antes eram a nobreza do povo, agora eles deram lugar a uma podridão alastrada.
Mas também já vi pedintes com exigências! A rejeitarem uma sandes e a preferirem coisas mais caras e que talvez alimentam menos.
Quem é o doido que anda a deixar a kikas escrever? =o!
Por acaso até gostei do post! xD
tens toda a razão kikas mas o facto é que, mais uma vez, essas situações dependem do carácter das pessoas. Falo nestes casos consciente de que muitos outros há de indivíduos que, deparando-se com uma adversidade, simplesmente baixaram os braços, se habituaram à triste situação em que (sobre)vivem e se julgam única e exclusivamente problema da sociedade.
O que não podemos esquecer é que também eles fazem parte do que chamamos Zé Povinho. A mudança de mentalidade também lhes faria falta certamente.
("Mentalidades. Já mudou a sua hoje?")
o p ministro e porque tem de haver igualdade?achas que toda a gente deve ter exactamente o mesmo?
concordo inteiramente com o argolinhas.
Nao pode haver total igualdade, uma vez que ha sempre pessoas que trabalham mais, que estudam mais, que se esforçam mais que outras.
Também tenho que concordar com o Argolinhas, não só por aquilo que o Anónimo referiu mas porque tem que haver sempre patronato e operariado, tem que haver sempre quem mande e quem sirva, logo a igualdade é uma utopia. Igualdade é como que o hino da anarquia, e ela é inconcebível a meu ver.
Mas acho que o PMinistro em vez de igualdade queria dizer diminuição das disparidades socio-económicas entre os portugueses. Estou errada?
Primeiro que tudo, desejo sorte a todos nas férias que se avizinham a partir de dia 14 de Setembro. x)
Óbvio que os membros parlamentares têm de receber regalias, afinal estão, supostamente, numa posição de responsabilidade na qual trabalham bastante e têm de ter incentivos para ocuparem essa função. Óbvio que a ocupam quase que fantasmagoricamente, já que o parlamento chega quase a ter tão pouca assistência como uma qualquer aula teórica universitária.
Alguém devia dar o primeiro passo em frente: "Não quero o carro, quero que dêem o dinheiro dele para ajudar a minha população". Mas já aqui se conseguem descortinar algumas reacções: primeiro a insistência natural dos responsáveis para fornecerem a regalia à mesma, nem que seja por razões de segurança (não me digam que esses carros não têm os vidros blindados ou pelo menos fumados), depois, o típico peer pressure, dos amigos deputados a dizer que ele está a fazer uma figura de parvo mártir e que não ganha nada com isso, e uma imagem bem mais hilariante que me surgiu agora que é a da própria população não estar a par do destino do dinheiro ou não querer acreditar e, como tal, fazer uma manifestação junto das entidades responsáveis, para justificarem ou mesmo rectificarem a situação, dado que o seu representante não é menos que os outros e deve ter direito às mesmas regalias. E por aqui podia continuar, por isso fico por me dizer que para o primeiro passo seria necessária bastante coragem.
Quanto à possível diminuição das disparidades socio-económicas, elas estão a ser tomadas, penso que a subida do salário mínimo têm tentado fazê-lo, mas são coisas que não se podem tomar de um dia para o outro e essa enorme diferença vai sempre existir. Não devemos, penso eu, tomar ideias comunistas de igualdade para todos os cidadãos e distribuição igual da riqueza, já que nem muitos de vós provavelmente quererão isso, nem os possíveis grupos económicos que pensam investir no nosso país, o que é ainda pior para o nosso país e digamos que essas medidas já não estão na moda há uns largos anos.
Mas, ainda assim, deixem-me dizer que penso que em parte, alguma da culpa pertence aos próprios Portugueses que magnificamente conseguem endividar-se para ir às compras ou para irem de férias. Ou seja, o dinheiro que podia ser investido em formação ou outros investimentos que poderiam vir a revelar-se mais frutíferos é canalizado para viagens de férias (que não trazem qualquer benefício) ou para roupa (que, muito provavelmente, não é para uma qualquer entrevista de emprego). Não que eu seja contra, há é que não ter como dizia o outro "mais olhos que barriga".
Se querem passar férias no Brasil, mas não há dinheiro, tiram-se no Algarve ou noutro destino turístico semelhante tanto em qualidade como em preço; se não há dinheiro para férias, não se tiram férias, fica-se em casa, se não quiserem preencher o vosso CV com coisas bonitas.
Mas, acreditem ou não, muitas das pessoas que fazem isto, são pessoas que muitas vezes quase que passam fome durante o ano, e depois chegam ao Verão e, como perante tantas privações, merecem, siga pedir um empréstimo e ir tirar umas férias a Cuba.
Muitos de vocês sabem a minha ideia quanto às manifestações dado que muitas são completamente desnecessárias, por isso tenho uma grande ideia a propor ao país! Ao ter estado atento ao debate entre o Louçã e a Ferreira Leite, em que discutiram sobre as taxas moderadoras na saúde.
Eu proponho uma taxa moderadora na manifestação, quem quiser participar numa manifestação tem de pagar 1 ou 2 euros conforme o salário conjunto que é auferido pela família.
Assim, provavelmente, não existiriam manifestações por dá cá aquela palha e não veríamos tantos cartazes como "Manuela, não te podem calar!". Relembro que a boca da senhora é grande, feia, difícil de calar e que alguém já o deveria ter feito há algum tempo.
A melhor forma de acabar com as manifestações -a meu ver- ainda não é essa da taxa moderadora mas sim as legislativas...
Quando algo estiver a correr mal/for penoso para uma entidade qualquer, vêm as legislativas e para além de alterações ainda é dado um pedido de desculpas.
Grande post Magnífico;)
Eu por acaso pensava que as taxas moderadoras era para moderar os gastos do Estado com a saúde, mas a Sra. Leite esclareceu-me e realmente era uma boa ideia, para aplicar não só nas manifestações mas noutras coisas, como atirar lixo para o chão, não apanhar os dejectos dos cãezinhos, enfim.
Sim, Magnífico... acabem com as manifestações! Rua com elas!
Há-as ridículas? Talvez...
Mas é mais grave generalizar as manifestações dizendo que elas são ridículas e desnecessárias do que dar valor a todas, até as que são ridículas.
Para mim 120 mil pessoas na rua numa manifestação, vindas de todas as partes do país e todas de uma única classe que é, normalmente, desunida é um argumento. Pelo menos em democracia sê-lo-ia...
Ahahah, Magnífico, não sei se viste o debate, mas serve apenas para diminuir a procura. Óbvio que é apenas uma ideia daquelas ridículas que eu tenho mas acho que têm uma piada fantástica.
E concordo contigo quando falas de 120 mil pessoas é impressionante. Se essas pessoas quisessem mesmo entrar na manifestação pagariam o euro sem problemas de maior. A única questão é se no meio da classe em questão não andariam por lá familiares, amigos, conhecidos dos trabalhadores, ou mesmo aqueles que devem adorar manifs e participam nelas porque gostam de passar o dia a esticar o braço e a gritar palavras de ordem x)
Atenção que estou a defender um argumento estúpido só mesmo porque sim, e óbvio que estou a exagerar, mas olha que acredito que no meio dos 120 mil nem todos fossem os próprios trabalhadores a defender os seus direitos.
E eu não generalizei as manifestações, eu disse que muitas delas eram desnecessárias, e são. Nunca percebi, nem vou perceber as manifestações tipo Manuela Moura Guedes, ou aquelas pessoas que ficam às portas dos tribunais a manifestar-se para que o pai fique com a filha em vez da mãe ou dos pais adoptivos. É desnecessário, pura perda de tempo, inconsequente e dá o mote a que os media tenham mais imagens negativas para mostrar à população, porque acredito que se os meios de comunicação mostrassem algumas notícias optimistas (o que não fazem), talvez as pessoas ficassem elas próprias mais optimistas e isto andasse um bocado para a frente.
P.S.(D.) - Mau, julgava que estávamos em democracia desde o 25 de Abril de 1974 x)
Ouvi foi dizer pessoas que queriam estabelecer uma monarquia durante uns tempos para pôr o país em ordem e quiçá depois re-estabelecer a democracia, e digo-te já que não foi o partido monárquico. Pelo andar da carruagem vai-te habituando e vai-me chamando Vossa Majestade Imperial
Não Magnífico, era voltar à ditadura, mas continuando a ser uma República. Acho que o Duque de Bragança não tem nenhum contrato, pacto ou chantageou a Ferreira Leite, já para não falar que o Cavaco era capaz de se sentir ofendido.
O Alberto João Jardim é que era capaz de gostar da ideia, se é que lhe iria afectar alguma coisa - acho que na Madeira já estão habituados a esse regime político, ainda que disfarçado.
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