Há palavras que guardamos e que só quando já é demasiado tarde ousamos largar. Partiste hoje mas deixaste-me bem mais do que pensas. Lamento apenas as palavras que não disse, as coisas que não fiz... mas vejo-te a ir sabendo que grande parte de ti fica em mim. Para mim serás sempre a Mina, comigo estarão sempre a varejeira, as histórias do Sr. David, as refeições dadas à janela de minha casa e, claro, o monstro que vivia no fundo da rua...
Ao olhar para o novo Governo, conhecido no dia de ontem, há algo que me salta à vista: a ausência, em termos gerais, dos políticos de profissão, dos tradicionais cola-cartazes que nos têm representado durante os últimos anos. São pessoas de mérito nas respectivas áreas e isso é algo bastante importante. Até pode vir a revelar-se um desastre, mas parece-me um ponto bastante positivo - e é, confesso, uma surpresa para mim.
Mas passo, agora, à análise do ministro de uma das pastas mais polémicas dos últimos anos: Nuno Crato, novo ministro da Educação. E faço-o porque o considero o retrato da passagem de testemunho. Senão reparem: nos últimos anos Portugal tem evoluído bastante em termos estatísticos na área da Educação. De súbito, os portugueses - que eram péssimos a Matemática - passaram a ter óptimas notas, a quantidade de alunos no Ensino Superior disparou, o número de pessoas com formação também. Criaram-se as Novas Oportunidades, baixou-se o nível de exigência e, milagre, Portugal cresceu bastante nos indicadores que à Educação dizem respeito.
Obviamente que tudo isso é pura fachada. Mas isso era a imagem de um Governo que tinha como Primeiro-Ministro alguém que concluiu uma licenciatura a um Domingo. O que interessava era a imagem, era melhorar nos indicadores externos, subir nos rankings. Era a época do facilitismo. Agora, pelo menos se Nuno Crato aplicar o que sugere no vídeo em baixo, a conversa é outra.
O ministro da Educação defende a exigência como factor central no ensino em Portugal. Defende que os exames não devem ser realizados por uma instituição ligada ao Ministério da Educação, caso contrário estarão a ser realizados pelo organismo que se pretende avaliar. Defende, portanto, o fim da governação das aparências, dos rankings, da fachada, do facilitismo.
Mas há um grave problema nisto tudo e é precisamente por isso que escrevo este texto: é que Portugal vai ser visto, novamente, como um país em recessão ao nível da educação. Não tenho dúvidas de que com mais exigência haverá menos licenciados, de que sem as Novas Oportunidades haverá menos gente com o 12º ano. Isso será reflectido nos indicadores, nas estatísticas e nos rankings. E, provavelmente, será usado daqui a uns anos contra este governo.
Por isso mesmo o escrevo aqui hoje: prefiro um país com menos licenciados mas com gente que tenha capacidade para o ser, do que o país da fachada e do facilitismo que tem sido nos últimos anos. Há que formar, sim, mas há que formar BEM.
PS: espero que Nuno Crato se lembre de que para exigir nos exames é necessário ter a mesma exigência para com o seu próprio ministério. Os programas actuais de algumas disciplinas são irreais. Mais vale aprender menos e aprender bem, do que criar um programa tão extenso que será impossível de cumprir. Os exames são importantes, sim, mas não creio que esse seja o primeiro passo.
Que se adeqúem os programas, que se revejam os métodos, que se avaliem os professores - não sei até que ponto será exequível a avaliação com base na evolução das notas dos alunos - e que, aí sim, se exija mais nos exames. Porque, sempre o defendi, o professor exigente não é o que dá más notas: é o que exige aquilo que ensina aos seus alunos. A grande tarefa deste ministro será, primeiro que tudo, conseguir reformular os programas para que possa ser exigido aquilo que de facto é possível ensinar no limitado tempo que se tem disponível.
"Fizeste intercâmbio? Como é que foi? Sentiste que mudaste?"
São perguntas delicadas, mas são aquelas a que um ex-intercambista tem de se habituar a responder. Não é fácil conseguir resumir um período em que se foge da realidade em que se viveu durante tantos anos. Não é fácil explicar "como foi" ou "o que mudou". É, aliás, dificílimo fazê-lo.
Qualquer pessoa que tenha estado a estudar no estrangeiro acaba por ser confrontada com a curiosidade de todos. O problema é que não há muita gente que tenha paciência para ouvir a resposta tal como ela deve ser dada - com pormenor.
Costumo dizer que não é a experiência de intercâmbio que nos muda. São as experiência, os episódios, as dificuldades, as loucuras que, dentro do intercâmbio, fazem com que voltemos pessoas diferentes. Pessoas com novas ideias, conhecedoras de novas culturas, mais conhecedoras de si mesmas. Pessoas com mais mundo, com mais vida. Pessoas que foram obrigadas a sair da sua realidade, a saltar para uma dimensão completamente nova. Que tiveram de reorganizar os seus hábitos, de se adaptar a novas culturas, de enfrentar os seus medos ou de resistir às saudades. Que, sob pena de passarem vários meses solitários num país diferente, tiveram de fazer amigos numa idade em que normalmente já se tem um grupo formado. São, acima de tudo, pessoas que tiveram de renascer.
No fundo o intercâmbio é isso: um renascimento. É um regresso à infância, no sentido de que temos todos de voltar a ter aquela abertura que nos permite falar com pessoas novas, procurar conhecê-las deixando de lado os estereótipos e preconceitos formados durante anos de vida. A experiência é tão nova, tão única, que não é facilmente explicável a quem a não viveu.
Talvez seja precisamente por isso que são os que já foram que, no regresso, incentivam os outros a ir, também. E talvez o façam por perceberem o que teriam perdido se tivessem ficado por "casa"...