quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Campanha Eleitoral


 O Brasil está em campanha eleitoral. Qualquer vulgo "gringo" repara logo nisso, porque torna-se complicado passar indiferente às pessoas com bandeiras a publicitar os deputados, os cartazes, as bicicletas com bandeiras e os panfletos que nos são dados em cada esquina.

Há uma infinidade de candidatos, desde o Wilson Perna-Torta à Mulher-Pêra, passando pelo nosso bem conhecido Romário ou pelo Bebeto. O que mais fama ganhou acabou por ser o Tiririca, um humorista que se candidatou... mas há muitos outros.

As grandes frases do Tiririca são:
"O que faz um Deputado Federal? Também não sei. Mas vote em mim que eu depois te conto!"
e
"Vote Tiririca. Pior do que está não fica!"

Alguns dizem que é falta de respeito. Que é uma vergonha e que há que levar a sério uma coisa séria como estas. Agora eu pergunto: não será maior falta de respeito candidatarmo-nos como Engenheiros e não dizermos que tirámos o curso a um Domingo e que a Licenciatura lhe calhou na raspadinha?

Não será maior falta de respeito candidatarmo-nos como uma personalidade importante e na verdade sermos o come-tachos, cola-cartazes típico da política portuguesa?

Não será maior falta de respeito mentir às pessoas que votam neles?

É que eu sinceramente acho estes gajos mais sérios do que os que temos em Portugal. Pelo menos são sinceros. E assim como assim as pessoas em Portugal votam nos seus clubes: votam no PS porque são do PS e no PSD porque são do PSD. Se mentirem tanto melhor: mais votos terão...

Mas eu continuo a preferir os Tiriricas...

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Já que estudo na Fundação Getúlio Vargas..


Getúlio Vargas suicidou-se há 56 anos. O Presidente brasileiro não resistiu à pressão para se demitir e optou pela saída mais drástica. 
 
"Se a simples renúncia ao posto a que fui levado pelo sufrágio do povo me permitisse viver esquecido e tranquilo no chão da pátria, de bom grado renunciaria. Mas tal renúncia daria apenas ensejo para, com mais fúria, perseguirem-me e humilharem-me. Querem destruir-me a qualquer preço. Tornei-me perigoso aos poderosos do dia e às castas privilegiadas. Velho e cansado, preferi ir prestar contas ao Senhor, não dos crimes que não cometi, mas de poderosos interesses que contrariei, ora porque se opunham aos próprios interesses nacionais, ora porque exploravam, impiedosamente, aos pobres e aos humildes. Só Deus sabe das minhas amarguras e sofrimentos. Que o sangue dum inocente sirva para aplacar a ira dos fariseus".

Com estas palavras manuscritas, Getúlio Vargas, 72 anos, Presidente do Brasil, explicava o que o tinha motivado a disparar o seu revólver Colt, calibre 32, sobre o próprio peito, por volta das 05h00 da madrugada de 24 de Agosto de 1954, nos seus aposentos no Palácio do Catete, que, na então capital federal do Rio de Janeiro, albergava a sede do Governo.

Um atentado, ocorrido no início do mês, contra Carlos Lacerda, um dos mais ferozes opositores de Getúlio, agravou uma crise política complexa em que o Brasil já vivia.

Líder do Partido Trabalhista Brasileiro, eleito pelo voto popular em 1951, depois de já ter sido presidente durante entre 1930 e 1945, Getúlio, gaúcho de São Borja, estava, nesse Agosto de 1954, a ser fortemente pressionado para renunciar.

As pressões sentiam-se no seio do seu próprio Governo e foi essa a mensagem que, na noite de 23 de Agosto, ouviu na última reunião ministerial a que presidiu. Na sua agenda, na página desse dia 23, uma segunda-feira, anotara: "Já que o ministério não chegou a uma conclusão, eu vou decidir: determino que os ministros militares mantenham a ordem pública. Se a ordem for mantida, entrarei com pedido de licença. Em caso contrário, os revoltosos encontrarão aqui o meu cadáver".

A notícia do suicídio de Getúlio deixou o Brasil em choque. A família não aceitou a oferta do vice, Café Filho, que assumira a Presidência, para que um avião militar transportasse o corpo até ao Rio Grande do Sul e rejeitou, também, as homenagens oficiais que o novo governo queria prestar ao Presidente falecido.
 
Getúlio deixou duas notas de suicídio, uma manuscrita e outra datilografada. A manuscrita apenas foi divulgada em 1967, pela filha, Alzira Vargas. A versão datilografada foi lida por João Goulart, no funeral, em São Borja. É desse texto que consta outra frase de Getúlio que o tempo revelou ser certeira: "Saio da vida para entrar na história".

in Rádio Renascença

domingo, 22 de agosto de 2010

Favores em cadeia


A pedido da G. conto, agora, a história de que falei durante o post anterior.
Tudo se passou durante uma visita de estudo no meu 6º ano. Parámos numa estação de serviço e, estava eu na fila, vem um amigo que me pede para lhe levar um pacote de batatas fritas. Aceito o dinheiro que ele me dá, julgando que ele tinha visto o preço e dado dinheiro suficiente. Não tinha.

Quando cheguei à caixa não tinha dinheiro suficiente para pagar. Ia voltar a meter as coisas nas prateleiras quando uma senhora me diz:
- Deixa que eu pago o que falta. O que te peço é que se algum dia vires alguém numa situação semelhante faças o mesmo que eu estou a fazer agora.
- Muito obrigado - disse, tão envergonhado como surpreendido.

Quando cheguei a casa contei aos meus pais e ao meu padrinho, que estava com eles. Logo ele me disse:
- Essa é a ideia de um filme. Chama-se Pay it Back, em português é o Favores em Cadeia.

Fui logo ver o filme. A ideia central é a seguinte:
Uma pessoa faz um favor importante a outras 3. Em vez de pedir para que essas pessoas lhe devolvam os favores, pede-lhes que elas façam 3 favores a outras 3 pessoas ,e assim sucessivamente. A corrente cresceria bastante rapidamente. Seriam inicialmente 3 boas acções, depois 27...

Quando esta ideia vingar todas as pessoas já terão beneficiado desta corrente e terão feito com que alguém beneficiasse dela.

Ontem cumpri a minha parte e continuarei a cumprir. Não só pela satisfação que deixo nos outros, como pela alegria que me dá a mim mesmo...

sábado, 21 de agosto de 2010

Promessa cumprida...


Canela rasgada, pé esfolado, corpo dorido, respiração ofegante, sorriso nos lábios e brilhozinho nos olhos. Eis como cheguei a casa.

Fui jogar futebol à tarde e à noite, com dois grupos diferentes e, em ambos, fosse pela minha estrondosa qualidade, fosse simplesmente pela nacionalidade, deixei de ter o meu nome. De hoje em diante serei Deco, em terras de Vera Cruz...

Só por si já seria motivo de orgulho. Houve golos e muita magia. Mas o melhor de todos marquei-o fora do campo...

O grupo da noite reúne-se todas as Sextas-Feiras na Praia de Ipanema. É composto por gente com pós-graduação, por meros trabalhadores, por moleques de rua e outros de favela. A faixa etária vai dos 8 aos 30 anos e a altura do metro e meio aos dois metros. Enfim, o Brasil no seu melhor. A convivência entre ricos e pobres, velhos e novos; todos eles reunidos à volta de uma bola de futebol...

Por ser português é natural que desperte a curiosidade dos moleques. Estava sentado a falar com o Filipe e o Rafael, ambos com 21 anos, e eis que aparecem 4 moleques e se sentam à nossa volta:
- Pô, esse cara é mesmo burro. 'Tá em Portugal e vem p'ró Brasil viver?!

Falava de mim, o miúdo. Lá lhes expliquei que talvez não fosse assim tão mau viver no Brasil, um país em que, desde que estudes, tens inúmeras possibilidades. Contei-lhes que Portugal estava mal, com muito desemprego e que se calhar era melhor viver num país no qual têm a garantia de que se trabalharem conseguem arranjar um emprego, do que noutro em que mesmo que passem a vida a estudar se arriscam a acabar num balcão do McDonalds.

Era a nossa vez de jogar. Cá fora ficavam alguns moleques a "brincar à porrada", rebolando no chão e sufocando-se uns aos outros. Quando voltámos cá para fora estava um doeles a chorar convulsivamente.

O Filipe perguntou-lhe o que se passava e ele explicou, entre os soluços, a baba e o ranho, que o amigo lhe tinha tirado as chaves do porta-chaves e depois as tinha perdido.
- Vou ficar de castigo um mês! Hoje só vou poder ir para casa às 7, porque não tenho chave para entrar. E na Segunda, quando vier da Escola meu pai vai me dar tanta porrada...

Todos os que estavam de fora procuraram as chaves. À noite e numa praia tão grande era impossível encontrá-las... Desistimos.

- Vai ter de apanhar com as consequências... - disseram-lhe.

E o moleque chorava mais e mais. Garoto de favela. Olhar perdido de medo. Sem sítio para dormir, provavelmente mais por medo de voltar para casa, do que por não ter ninguém para lhe abrir a porta, tal como dizia...

Chamei-o e falei com ele:
- Um dia estava eu a comprar umas coisas e fiz mal as contas aos preços. Não tinha dinheiro para pagar tudo. Ia voltar a meter as coisas na prateleira quando uma senhora me agarra e diz: "deixa que eu pago. Só quero que me prometas que se algum dia vires alguém numa situação semelhante fazes o mesmo". Portanto diz-me lá, quanto é que custam umas chaves novas?
- 3 ou 4 reais...
- Então relaxa que eu dou-te dinheiro para as chaves. Acredita que não sou rico, tenho passado o tempo a comer atum para poupar dinheiro. Mas acho que estes 5 reais te darão muito mais jeito a ti do que a mim, até porque posso perfeitamente ficar sem comer durante uma refeição. O que te peço é que se algum dia alguém precisar tu o ajudes também. E que acredites que há  pessoas boas no mundo, que não há só a corrupção e a violência que todos os dias ouves e vês aqui no Rio. Prometes-me?

Acenou com a cabeça, ainda com a cara molhada das lágrimas. O espanto dele era imenso. Contou ao Filipe e ao Rafael, que tinham estado a falar comigo e eles vieram-me perguntar:

- Porque é que fizeste isso? Estávamos aqui 20 pessoas e ninguém pôs essa hipótese...
- Chama-me maluco, mas eu ainda acredito num mundo em que um pequeno gesto pode mudar a vida de alguém. É menos uma lata de atum que compro e é um miúdo que não vai apanhar uma malha quando chegar a casa. Se de entre estes 10/15 moleques que aqui estão houver um a ficar sensibilizado com o acto, já terei feito bem mais do que poderia desejar em 5 meses no Rio...

O Filipe, o Rafael e o Marcel vivem bem perto de mim. Vieram os 3 mais o tal moleque das chaves comigo e esperaram na praia, perto de minha casa. Fui buscar o dinheiro e entreguei ao moleque. Despedi-me e, juro,  vi uma pontinha de emoção naqueles olhares.

Eu próprio cheguei a casa feliz. Tinha cumprido uma promessa feita durante uma visita de estudo no meu sexto ano. E, mais do que isso, tinha encontrado o Rio que existe para lá da noite, do sexo e da maconha...

[História real. 
Não teria imaginação 
para inventar uma assim...]

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Resumo de uma noite


- Estás a gostar do Rio?
- Estou, isto é fantástico...
- E já provaste a maconha daqui?
- Não, pá... parece-me que eu não vim viver o teu Rio.
- O meu Rio? Rio há só um: o da maconha, do sexo e da noite.


Triste de quem não vê mais além.

Arranjava-se uma casa baratinha em Vila Pouca do Campo, comprava-se umas colunas, levava-se maconha e metia-se lá umas gajas. Tinha o mesmo e era capaz de lhe ficar mais barato, não era?

(...e vim para casa dormir.)

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Garoto de Ipanema



Depois de 16 dias a comer atum ao pequeno almoço, almoço, lanche, jantar e ceia, resolvi tirar a barriga de misérias.

Como bom gestor que sou, andei a fazer uma pesquisa de mercado durante estes 16 dias. Por mais que procurasse não conseguia arranjar um sítio onde comer por menos de 20 reais (aproximadamente 9 euros). Minto: havia um ou dois restaurantes que tinham pratos a preços inferiores aos 20 reais referidos. Ficavam-se pelos 17 e, pelo aspecto, deviam incluir umas chicotadas no lombo enquanto nos maravilhávamos com a comida.

Foi isso que me levou a andar durante 16 dias a comer atum.

Mas hoje tudo mudou. Passei pelo Vinicius Bar, mesmo em frente ao famoso Garota de Ipanema e vi um papel enorme a dizer:
"Preços para executivos
Das 11 da manhã às 16 horas, de 2ª a 6ª dispomos dos seguintes pratos:
Esparguete Carbonara - 9,5 reais
Lasanha - 9,5 reais
Salsichão - 9,5 reais
Pizza - 10 reais
Frango a Parmigiana - 11,5 reais
Peixe Doré - 12,5 reais
Churrasco à Campanha - 13,5 reais
Às 4ªs e 6ªs há feijoada por 14,5 reais"

(Sei que os preços não vos interessam, mas dá-me jeito manter aqui a lista, para quando estiver farto de atum outra vez).

Não pensei duas vezes. Como era Terça Feira não fui para a feijoada, por isso escolhi o grande Churrasco à Campanha. Foram os 13,5 reais mais bem gastos da minha vida, acreditem...

Mas passando ao que interessa:

Estava eu a maravilhar-me com o almoço quando vejo um senhor com um ar de gente rica a olhar para mim fixamente. Entrou no restaurante e sentou-se duas mesas à minha frente, de costas para mim. Eu estava a achar aquilo estranho, até porque ele se metia de lado para mim e depois olhava-me meio às escondidas.

A certa altura levanta-se e vem falar comigo. Disse qualquer coisa que me pareceu "Você é trabalhador?" e eu pensei para mim mesmo: "este desconto era mesmo só para executivos, portanto se eu digo que sou estudante cobram-me os preços normais e eu vou ter de passar os 4 meses que sobram a comer atum. Portanto deixa-me dizer que sou trabalhador, que também não estou com assim tão mau aspecto!"

Seguiram-se umas frases num "brasileiro" atabalhoado, o que me levou a interrompê-lo:
- Espere aí, amigo, que eu não estou a perceber nada. O que é que você me perguntou, afinal?
- Ah estava só a confirmar que você era actor, aquele cara da Globo. É que eu tenho um amigo meu que é agente e que queria muito conhecer você, por isso eu lhe liguei, se você não se importar...
- Ó amigo eu não me importo nada, mas eu sou só trabalhador e não actor! Não tinha percebido o que me tinha perguntado!

O cara pediu desculpa e voltou à sua mesa com ar desconfiado. Deve ter ficado a pensar que eu não era um actor assim tão bom, porque notava-se perfeitamente que eu era, tal como ele supunha, actor mas que lhe tinha dado uma tanga para não ter de aturar o agente amigo dele...

E lá voltou o senhor de aspecto ilustre à sua mesa. Pegou no seu celular e ouvi-o dizer ao amigo "Parece que afinal fiz confusão. O cara estava falando em português de Portugal..."

Acabei o meu almoço de rei com o orgulho de ter sido confundido com um actor da Globo.  E isto depois de há uma semana também me terem tratado por Professor. Não há dúvida de que aqui sabem distinguir as pessoas com nível...

Acontece que o mendigo que me tratou por Professor, a seguir me pediu dinheiro. Porém, desta vez era genuíno: parecia-me com uma estrela da Globo! Melhor que isso só mesmo se me confundissem com o David Luiz, né?!

Ainda pensei em voltar lá para perguntar com que actor o senhor me tinha confundido. Estive a pensar em qual seria a fórmula correcta. Arriscava um:

"Amigo, já agora diga lá qual é o nome do actor. É só para eu me rir um bocado a contar a toda a gente lá em Portugal a barraca que acabou de dar!"

Portanto optei por um simples "Então adeus, amigo!", que ele retribuiu. 

Escusado será dizer que fica a vosso cargo descobrir com quem é que ele me confundiu...

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Procura-se um amigo


Não precisa ser homem, basta ser humano, basta ter sentimentos, basta ter coração. Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir. Tem que gostar de poesia, de madrugada, de pássaro, de sol, da lua, do canto, dos ventos e das canções da brisa. Deve ter amor, um grande amor por alguém, ou então sentir falta de não ter esse amor.. Deve amar o próximo e respeitar a dor que os passantes levam consigo. Deve guardar segredo sem se sacrificar.

Não é preciso que seja de primeira mão, nem é imprescindível que seja de segunda mão. Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são enganados. Não é preciso que seja puro, nem que seja todo impuro, mas não deve ser vulgar. Deve ter um ideal e medo de perdê-lo e, no caso de assim não ser, deve sentir o grande vácuo que isso deixa. Tem que ter ressonâncias humanas, seu principal objetivo deve ser o de amigo. Deve sentir pena das pessoa tristes e compreender o imenso vazio dos solitários. Deve gostar de crianças e lastimar as que não puderam nascer.

Procura-se um amigo para gostar dos mesmos gostos, que se comova, quando chamado de amigo. Que saiba conversar de coisas simples, de orvalhos, de grandes chuvas e das recordações de infância. Precisa-se de um amigo para não se enlouquecer, para contar o que se viu de belo e triste durante o dia, dos anseios e das realizações, dos sonhos e da realidade. Deve gostar de ruas desertas, de poças de água e de caminhos molhados, de beira de estrada, de mato depois da chuva, de se deitar no capim.

Precisa-se de um amigo que diga que vale a pena viver, não porque a vida é bela, mas porque já se tem um amigo. Precisa-se de um amigo para se parar de chorar. Para não se viver debruçado no passado em busca de memórias perdidas. Que nos bata nos ombros sorrindo ou chorando, mas que nos chame de amigo, para ter-se a consciência de que ainda se vive.

Vinicius de Moraes

sábado, 14 de agosto de 2010

Falta


Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.

Carlos Drummond de Andrade

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

A soldado desconhecida


Josefa, 21 anos, a viver com a mãe. Estudante de Engenharia Biomédica, trabalhadora de supermercado em part-time e bombeira voluntária. Acumulava trabalhos e não cargos - e essa pode ser uma primeira explicação para a não conhecermos. Afinal, um jovem daqueles que frequentamos nas revistas de consultório, arranja forma de chamar os holofotes. Se é futebolista, pinta o cabelo de cores impossíveis; se é cantora, mostra o futebolista com quem namora; e se quer ser mesmo importante, é mandatário de juventude. 

Não entra é na cabeça de uma jovem dispersar-se em ninharias acumuladas: um curso no Porto, caixeirinha em Santa Maria da Feira e bombeira de Verão. Daí não a conhecermos, à Josefa. Chegava-lhe, talvez, que um colega mais experiente dissesse dela: "Ela era das poucas pessoas com que um gajo sabia que podia contar nas piores alturas." Enfim, 15 minutos de fama só se ocorresse um azar... Aconteceu: anteontem, 

Josefa morreu em Monte Mêda, Gondomar, cercada das chamas dos outros que foi apagar de graça. A morte de uma jovem é sempre uma coisa tão enorme para os seus que, evidentemente, nem trato aqui. Interessa-me, na Josefa, relevar o que ela nos disse: que há miúdos de 21 anos que são estudantes e trabalhadores e bombeiros, sem nós sabermos. Como é possível, nos dias comuns e não de tragédia, não ouvirmos falar das Josefas que são o sal da nossa terra?

Por FERREIRA FERNANDES, Diário de Notícias

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Um primeiro olhar sobre o Rio


Ontem comecei a viver o MEU Rio. Provavelmente um Rio que não faz inveja a ninguém, mas o Rio que, sem dúvida, eu prefiro viver...

Este primeiro dia foi vivido sozinho. Fui a correr de Ipanema ao Leblon, do Leblon ao Arpoador e daí para Ipanema novamente, onde tenho casa. Comi a bela sanduíche de atum que me vai acompanhar durante seis meses à hora de almoço e logo retomei.

Inicialmente a ideia era partir à procura de um campo de futebol de praia. Ipanema, Arpoador, Copacabana... mas logo surgiu algo muito diferente do que eu podia imaginar. Em vez do campo de futebol encontrei uma beleza incrível. 

As gaivotas a rasar as ondas enormes que batiam com estrondo na areia, que reflectiam o sol, que molhavam as crianças, que desafiavam os surfistas, que destruíam os castelos de areia que, com carinho, iam sendo construídos por pais ajudando seus filhos.

Ali fiquei, em plena praia de Copacabana, sentado a sentir o meu Rio. Toda aquela harmonia crescia dentro da minha cabeça ao som do Samba de Orly. Havia no ar algo que eu nunca tinha vivido e que, por isso, se torna difícil de explicar...

O Rio é uma cidade diferente. É cheia de ritmos, de histórias, de Sol e de gente. É uma cidade onde a poesia nasce a cada esquina, onde cada raio de Sol nos ilumina com os mais belos versos.

Já ao final da tarde, com o Sol a esconder-se atrás dos Morros, parecia terminar a poesia. Uns metros à minha frente comecei a ver uma multidão, uma espécie de procissão... acelerei o passo para tentar perceber o que se passava. E é então que começo a ouvir uma banda em tons de Jazz, mas com ritmos de Bossa Nova.

Faziam a ligação perfeita ao ambiente fantástico que se vivia. Mas não ficavam parados num sítio. Continuavam a andar ao longo de todo o calçadão e eram de tal modo especiais que muita gente saía da praia para os ir ouvir e acompanhar no seu percurso. Andei uns minutos no passo lento da banda. Aquela música tinha um sabor especial.

O Sol quase desaparecera e a banda parara. Um monumental aplauso surgiu vindo das ruas, das praias, das ondas, dos bares...

Imediatamente pensei que o Chico Buarque não terá precisado de tanta imaginação quanto eu supunha para escrever uma das minhas músicas preferidas: A Banda.

Desiludido por não ter conseguido ouvir aquela harmonia toda por mais tempo, encaminhei-me em passo lento até ao mar. Dei o último mergulho do dia e estive a ver o Sol a esconder-se entre o Morro Dois Irmãos.

Naquele passo lento e em silêncio, a tentar aproveitar o que nunca tinha sentido, dirigi-me até casa. Antes de virar a esquina atrevi-me a deitar um último olhar sobre aquele mar... e logo me vieram à cabeça as palavras de Carlos Drummond de Andrade:
No mar estava escrita uma cidade.
Estava mesmo...

domingo, 8 de agosto de 2010

O primeiro dia do resto da minha vida...


Tal como fui dizendo para quem queria (e para quem não queria) ouvir, este blog vai passar a ter mais uma nobre função. Vamos ter alguns selvagens e muitos visitantes espalhados pelo mundo. Muitas histórias terão para contar, sejam elas boas ou más. Seria óptimo se conseguissemos tornar este sítio naquele cantinho do Mundo em que as podemos partilhar.

Este é o meu primeiro post na Cidade Maravilhosa. Hoje é o dia em que me separei das pessoas que mais amo.

E é por isso que me surgiu esta dúvida:
Será mais triste uma despedida triste, ou uma despedida sem tristeza?

Eu prefiro a primeira.

Definitivamente...

Publicidade

Para efeitos legais é importante explicar que o nosso site usa uma Política de Publicidade com base em interesses.